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Artigo Especial

Uso da pele de tilápia do Nilo em medicina regenerativa: Status atual e perspectivas futuras

Nile tilapia fish skin use in regenerative medicine: Current status and future perspectives

Edmar Maciel Lima Junior1; Manoel Odorico de Morais Filho2; Marina Becker Sales Rocha3; Carlos Roberto Koscky Paier4; Felipe Augusto Rocha Rodrigues5; Bruno Almeida Costa6

RESUMO

OBJETIVO: O presente estudo tem como objetivo apresentar a trajetória do desenvolvimento da pele de tilápia como curativo biológico.
MÉTODO: Descrição do processo de desenvolvimento da pele de tilápia como curativo biológico, desde a concepção da ideia para utilização no tratamento de queimaduras, até as perspectivas de sua utilização como scaffold em múltiplas especialidades médicas.
RESULTADOS: Com o objetivo de oferecer uma alternativa segura, eficaz e de baixo custo para o tratamento de queimaduras, pesquisadores brasileiros desenvolveram um curativo biológico derivado da pele de tilápia.
CONCLUSÃO: A pele de tilápia vem demonstrando um notável potencial como curativo biológico no tratamento de queimaduras e na medicina regenerativa.

Palavras-chave: Tilápia do Nilo. Queimaduras. Ensaio Clínico. Curativos Biológicos. Materiais Biocompatíveis.

ABSTRACT

OBJECTIVE: The present study aims to present the development trajectory of the tilapia skin as a biological dressing.
METHODS: To describe the development process of tilapia skin as biological dressing, from the conception to the burn wounds treatment to the perspectives of its use as a scaffold in multiple medical specialties.
RESULTS: In order to provide a safe, effective and low-cost alternative for the treatment of burn injuries, Brazilian researchers have recently developed a biological dressing derived from tilapia skin.
CONCLUSION: The tilapia skin have been demonstrating the remarkable potential as a biological dressing in burn injuries treatment and in regenerative medicine.

Keywords: Nile Tilapia. Burns. Clinical Trial. Biological Dressings. Biocompatible Materials.

INTRODUÇÃO

Queimaduras constituem um importante problema de saúde pública no Brasil, com cerca de 1.000.000 de casos registrados todos os anos. Dentre os pacientes acometidos, cerca de 100.000 buscam atendimento hospitalar e, destes, cerca de 2.500 irão a óbito, direta ou indiretamente, em função de suas lesões1.

O tratamento disponibilizado pela grande maioria dos serviços da rede pública é a pomada de sulfadiazina de prata, com curativos diários ou em dias alternados2. Devido à necessidade sucessiva de troca de curativos, o tratamento torna-se bastante doloroso e há um aumento no índice de infecções e de perda de líquidos. Ademais, uma revisão da Cochrane concluiu que não há evidência suficiente suportando que cremes contendo prata melhorem as taxas de cicatrização3.

Quando se pensa em um tratamento ideal de queimaduras de espessura total, a pele autóloga (autoenxerto) se torna a primeira opção. Entretanto, se a área lesionada for de grande extensão, a oferta de tecido por área doadora não é suficiente para o reparo destas lesões, sendo então necessárias outras alternativas de coberturas com esta finalidade4. Ademais, o número de Bancos de Pele Humana brasileiros é aquém do recomendado. Segundo o Ministério da Saúde, para suprir a necessidade de pele humana para uso no tratamento de queimaduras no Brasil, seriam necessários 13 bancos, distribuídos pelas cinco regiões do país5. No Brasil existem apenas quatro bancos de pele humana, os quais conseguem disponibilizar somente 1% dos aloenxertos necessários para o tratamento de queimaduras graves6.

Diante do exposto, o anseio dos profissionais brasileiros que atuam em centros de queimados e, principalmente, dos pacientes atendidos nessas instituições é ter disponível uma opção de tratamento eficaz, de baixo custo, e que provoque a menor quantidade de dor possível. Apesar de existirem opções de curativos de qualidade no mercado, muitos destes produtos têm um custo elevado, impossibilitando seu uso no serviço de saúde público brasileiro. Com o intuito de prover um tratamento custo-efetivo para queimaduras e feridas, foi idealizado o curativo biológico derivado da pele de Tilápia-do-Nilo. O objetivo do presente trabalho é descrever toda a trajetória de desenvolvimento do material até chegar ao produto final.


DESENVOLVIMENTO

Pele de tilápia como biocurativo: a concepção da ideia


No ano de 2011, ao ler em um jornal pernambucano que, na cadeia produtiva da Tilápia-do-Nilo, um dos peixes mais consumidos no Brasil, tudo era aproveitado (vísceras, espinhas e carne), exceto a pele, o médico cirurgião plástico pernambucano Marcelo Borges teve a idéia de utilizar a pele de tilápia para o tratamento de queimaduras.

No entanto, somente no ano de 2014 o pesquisador e cirurgião plástico cearense Edmar Maciel, acompanhando a dificuldade de iniciar a pesquisa com a pele de tilápia, convidou o Dr. Marcelo Borges e o pesquisador cearense Odorico Moraes para realizar as pesquisas no Ceará, onde foram desenvolvidos todos os produtos derivados da pele da tilápia.

O início do desenvolvimento

Em 2015, após a equipe inicial de pesquisadores ser formada, o primeiro passo foi conhecer o processo de produção da tilápia. Para isto, os pesquisadores foram conhecer a psicultura no Açude Castanhão, em Jaguaribara, no Ceará, para entender sobre a criação da tilápia.

Compreendido o processo de produção do peixe, o passo seguinte foi estabelecer o método de produção da pele a ser utilizada nas pesquisas, com animais e seres humanos. Com esta finalidade, foi construído, no ano de 2015, o Laboratório de Cicatrização, localizado no Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos do Ceará (NPDM), da Universidade Federal do Ceará (UFC), onde foram estabelecidos os mesmos processos empregados nos bancos de tecidos de pele humana para limpeza, para esterilização e para envelopamento da pele da tilápia.

Com o objetivo de garantir uma correta padronização dos procedimentos, foram realizadas visitas técnicas aos bancos de pele localizados em Recife-PE, em Curitiba-PR, em São Paulo-SP, no Rio de Janeiro-RJ e em Porto Alegre-RS, além da contratação da consultoria especializada da enfermeira chefe do Banco de Pele em Recife - Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira. Ademais, foi firmada uma parceria com o Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares - IPEN-SP, para o estabelecimento do processo de esterilização. Através da implantação destes procedimentos, foi possível a concepção do primeiro Banco de Pele Animal do Brasil e o primeiro Banco de Animal Aquático do mundo, no NPDM-UFC.


ESTUDOS PRÉ-CLÍNICOS IN VITRO E IN VIVO

Estabelecido o processo de produção e esterilização das peles, os pesquisadores seguiram para os estudos in vitro, com a caracterização da microbiota da pele e da cavidade oral da tilápia, onde foi constatada a ausência de microrganismos patogênicos nas amostras coletadas7.

Também foram realizados estudos histológicos e histoquímicos para comparar a pele de Tilápia-do-Nilo com a pele humana, além de testes de microtração para avaliação das propriedades tensiométricas de ambos os materiais. Como resultado, foi encontrado que as características microscópicas da pele da tilápia são semelhantes à estrutura morfológica da pele humana, com a presença de grande quantidade de colágeno tipo I, e que a pele da tilápia tem elevada resistência e extensão à tração em quebra8.

Ademais, foi avaliado o impacto de cada etapa do processo de esterilização com glicerol e irradiação, nas características microscópicas da pele de tilápia. Ao final dos testes, foi verificado que as diferentes substâncias utilizadas no processo de esterilização não modificam a constituição histológica da pele de tilápia e que as amostras submetidas à irradiação apresentaram, de forma dose-dependente, maiores valores de deformação à tração e menor extensão à tração em quebra. Entretanto, a radiação na dose de 25kGy se mostrou eficaz para esterilizar e preservar as características microscópicas e tensiométricas da pele de tilápia9.

Todos estes resultados obtidos sinalizaram a possibilidade de aplicação da pele de Tilápia-do-Nilo como curativo biológico temporário em queimaduras. Diante disto, os pesquisadores iniciaram pesquisas pré-clínicas in vivo. Foi avaliada a utilização da pele de Tilápia-do-Nilo como curativo oclusivo temporário nas queimaduras de segundo grau superficial e profunda em ratos.

Neste estudo, o material apresentou boa aderência no leito das feridas induzidas por queimaduras nos ratos, interferindo positivamente no processo cicatricial, com menor infiltrado inflamatório e menos secreção, sem apresentar alterações significativas nos exames laboratoriais dos animais. Estes resultados encorajaram o prosseguimento das investigações das pesquisas em seres humanos, para confirmação de sua segurança e eficácia10.


ESTUDOS CLÍNICOS

Avaliação de segurança: estudo clínico Fase I


Frente aos resultados positivos obtidos na fase pré-clínica, em 2015, os pesquisadores deram início aos estudos em humanos, primeiramente, realizando um estudo clínico fase I, com o objetivo de comprovar a ausência de potencial antigênico ou alergênico da pele da tilápia, quando aplicada em humanos sadios. Dos 70 participantes incluídos, 4 (6,9% do total) apresentaram sinais clínicos de irritação cutâneos, sendo que, entre estes sujeitos, três já relatavam histórico prévio de alergias e o outro sujeito apresentou reação no local onde o esparadrapo estava aderido, não qualificando, desta forma, uma reação relacionada à pele da tilápia. Assim, 93,1% dos participantes da pesquisa não apresentaram nenhum tipo de reação. Tais resultados demonstraram que a pele não causou irritação ou sensibilização significante na pele dos sujeitos de pesquisa saudáveis, demonstrando segurança na sua utilização em seres humanos (dados não publicados).

Estudos clínicos Fase II em adultos e crianças

Comprovada a segurança da aplicação da pele de tilápia em humanos sadios, entre os anos de 2016 e 2017, foi conduzido um estudo clínico fase II em adultos. O intuito foi investigar se o uso da pele de tilápia como curativo biológico oclusivo possuía efeito benéfico sobre a cicatrização de feridas produzidas por queimaduras, quando comparado à terapia convencional (sulfadiazina de prata). Os desfechos primários analisados foram o número de trocas de curativos e a quantidade de anestesia e/ou analgesia utilizada até a cura da lesão.

Neste estudo foram incluídos participantes com queimaduras de 2° grau superficial, tanto pacientes ambulatoriais (até 10% da superfície corporal queimada - SCQ) quanto pacientes internados (entre 15 e 30% SCQ), além de indivíduos internados com queimaduras de 2° grau profundo. Como resultado, a pele da tilápia apresentou boa aderência no leito das feridas, diminuindo o número de troca de curativos. Consequentemente, houve redução do quadro de dor e no sofrimento dos pacientes e redução do número de anestesias e de analgesias utilizadas. Ademais, a pele de tilápia diminuiu o tempo de epitelização, beneficiando os pacientes e o serviço de tratamento de queimados11. Houve redução nos custos do tratamento ambulatorial de 57,04%, comparado com o tratamento convencional com sulfadiazina de prata.

No primeiro semestre do ano de 2017 foi iniciado o estudo clínico piloto fase II, com conclusão em 2018. Desta vez, foram incluídas crianças de 2 a 12 anos de idade com feridas produzidas por queimaduras de 2° grau superficial em uma área de superfície corporal queimada menor que 15%. Neste ensaio clínico, a pele da tilápia novamente mostrou boa aderência ao leito da ferida, reduzindo o número de trocas de curativos e, consequentemente, os níveis de dor e ansiedade e a quantidade de anestésicos utilizados12,13.

Estudo clínico Fase III

Entre 2017 e 2019, foi conduzido um ensaio clínico fase III comparando os curativos com pele de Tilápia-do-Nilo e com sulfadiazina de prata14. Foi incluído um total de 116 participantes ambulatoriais adultos, acometidos por queimaduras de segundo grau superficial, envolvendo uma área não superior a 15% da superfície corporal. Como resultado, constatou-se que, quando comparado com sulfadiazina de prata, o grupo tratado com pele de tilápia apresentou redução dos seguintes parâmetros: número de dias até a completa reepitelização; dor durante o tratamento, tanto a dor mensurada por aplicação de questionário (escala visual analógica - EVA)15 quanto a dor mensurada pelo teste de Von Frey eletrônico (TvFE); ansiedade relacionada a procedimentos dolorosos verificada no transcorrer do tratamento; número de curativos e quantidade de dipirona necessária para a analgesia. Este estudo demonstrou uma redução de 50,4% nos custos ambulatoriais do tratamento.

Todos os estudos acima citados referem-se à pele da tilápia esterilizada no glicerol e irradiada.


PELE DE TILÁPIA LIOFILIZADA

Com o intuito de facilitar a logística do transporte e o armazenamento da pele da tilápia como biocurativo, os pesquisadores Edmar Maciel, Odorico Moraes, Carlos Paier e Felipe Rocha desenvolveram a pele da tilápia liofilizada (bem como os demais produtos a serem citados adiante), visto que o produto nessa apresentação não precisa ser mantido em refrigeração.

O processo de liofilização apresenta outras quatro possíveis vantagens em relação ao processo de glicerolização: 1 - Causar menos dor ao paciente em sua aplicação (o glicerol é responsável por causar desconforto, quando em contato com a ferida se não for totalmente removido); 2 - Facilitar o processo de aplicação do curativo biológico no paciente (não é preciso realizar as sucessivas lavagens em soro fisiológico, exigidas para a pele glicerolizada, tornando o processo mais prático e rápido)16, 3 - Redução no risco de contaminação, por ser um processo embalado a vácuo, que não propicia crescimento bacteriano; e 4 - Diminuição no custo de transporte, para envio da pele para outros estados e países.

Considerando que a pele de tilápia liofilizada consiste em um novo produto, foi registrada uma nova patente e os pesquisadores realizaram outro ensaio clínico fase II. Desta vez, o curativo experimental foi comparado com um curativo de carboximetilcelulose sódica impregnada com prata (Na-CMC-Ag), em adultos com queimaduras de espessura parcial superficial. No grupo de teste, o número de curativos e a dor relatada pelo paciente após os procedimentos relacionados ao curativo foram menores. A ingestão de analgésicos, a ansiedade relacionada à dor e a dor relatada pelo paciente e mensurada objetivamente antes dos procedimentos relacionados ao curativo foram semelhantes nos grupos de tratamento17.


SCAFFOLD - MATRIZ DÉRMICA

A partir do conhecimento da estrutura histomorfológica da pele da tilápia, somado ao aprendizado adquirido com os resultados obtidos nos estudos clínicos, os pesquisadores idealizaram o uso da pele de tilápia como matriz dérmica. O desenvolvimento de um método de descelularização da pele para torná-la uma matriz acelular possibilitaria seu uso como matéria-prima para a fabricação de dispositivos médicos úteis em diversos tipos de reconstrução cirúrgica. O processo de produção deste biomaterial foi recentemente estabelecido, as pesquisas pré-clínicas in vivo estão em andamento. Em breve, novos ensaios em animais e humanos serão iniciados.

O uso da pele de tilápia como matriz dérmica é uma inovação, visto que os dispositivos congêneres disponíveis no mercado são derivados de mamíferos. O enxerto tecidual proposto é promissor, em razão do baixo custo da pele de tilápia, dos bons resultados prévios e do espaço para substituição de importações no mercado brasileiro de produtos de saúde.


DESENVOLVIMENTO DO PRIMEIRO BANCO DE PELE ANIMAL DO BRASIL E PRIMEIRO BANCO DE PELE ANIMAL AQUÁTICO MUNDIAL

Paralelamente ao desenvolvimento das pesquisas pré-clínicas e clínicas com a pele de tilápia, deu-se início à montagem do primeiro banco de Pele Animal do Brasil e primeiro Banco de Pele Animal Aquático do mundo18,19. Localizado no NPDM-UFC, em Fortaleza, funciona desde 2016, sendo inaugurado em 2017. O banco iniciou sua produção com 250 peles, mas atualmente já processou mais de 6000 peles de tilápia e encontra-se em fase de distribuição desta pele para estudos multicêntricos em outros estados (SP, GO, PR, PE, RJ e RS) e sete países (Estados Unidos, Alemanha, Portugal, Holanda, Equador, Argentina e Guatemala), que desenvolvem pesquisas nas áreas de ginecologia, ortopedia, endoscopia, estomaterapia, cirurgia vascular, odontologia, veterinária e pesquisas in vitro.


REGISTRO NA ANVISA

Diante do promissor uso dos produtos desenvolvidos da pele da tilápia nas mais diversas áreas da saúde, os pesquisadores realizaram o registro de Patente no Brasil, no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), e também no exterior.

Atualmente, estão sendo compiladas todas as informações obtidas através dos ensaios pré-clínicos e clínicos, além dos demais documentos exigidos, para obtenção do registro da pele de tilápia como biocurativo, na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Com o registro do produto através de uma empresa, o propósito dos pesquisadores é que a pele possa ser comercializada e disponibilizada inicialmente para uso em pacientes queimados da rede pública de saúde brasileira, sendo depois utilizada em outras especialidades médicas e outras áreas da saúde.

Abaixo, a Figura 1 ilustra a linha do tempo de todo o desenvolvimento da pele da tilápia e seus derivados, como biocurativo e matriz dérmica, até o atual momento:


Figura 1 - Linha do tempo do desenvolvimento da pele da tilápia.
Fonte: Elaborada pelo autor utilizando recursos da plataforma Mind the Graph, disponível em www.mindthegraph.com.



PELE DA TILÁPIA ALÉM DE QUEIMADURAS: NOVAS PERSPECTIVAS

O sucesso do uso da pele da tilápia em queimaduras levou os pesquisadores a diversificar os produtos e as aplicações desenvolvidos a partir da pele de tilápia, nas mais diversas áreas da medicina, tais como na ginecologia.

Na área da ginecologia, a matriz dérmica da pele da pele da tilápia teve sua primeira utilização em humanos, com sucesso para neovaginoplastia em paciente com síndrome de Mayer-Rokitnasky-Kuster-Hauser. Houve incorporação do biomaterial na neovagina das pacientes e diferenciação da cobertura interna do canal para um epitélio vaginal característico, fenômeno este observado e comprovado por biópsia ao longo dos meses20-22. Posteriormente, o material gerou bons resultados quando utilizado para cirurgia de redesignação de gênero e para neovaginoplastia, devido a estenose vaginal pós-radioterapia e síndrome de Morris23,24.

Além da ginecologia, a pele de tilápia também vem sendo estudada em úlceras varicosas, feridas, na odontologia e na veterinária em cães, gatos e cavalos25,26. Áreas como urologia, ortopedia, odontologia, cirurgia plástica (reconstrução mamária e enxerto de gordura), neurocirurgia, otorrino, oftalmologia, endoscopia e outras estão com estudos in vivo em andamento, com o uso da matriz dérmica da pele da tilápia. Outros estudos, como a extração do colágeno tipo I da pele da tilápia para produção de cosméticos e nutracêuticos e para confecção de pomada e spray para uso em queimaduras e feridas, estão em fase avançada.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados de estudos realizados com humanos vêm comprovando que a pele da tilápia além de ser segura, quando comparada ao tratamento padrão oferecido pela maioria dos serviços de saúde pública, apresenta boa aderência no leito das feridas, reduz a dor e o sofrimento dos pacientes, o número de dias até a completa reepitelização, o número de troca de curativos e, consequentemente, o número de anestesias e analgesias utilizadas, auxiliando no processo de cicatrização, diminuindo a perda de líquidos, demonstrando ter um significativo impacto benéfico nos pacientes e no serviço de tratamento de queimados, diminuindo os custos e o trabalho da equipe.

Resultados preliminares de pesquisas em diversas outras especialidades médicas (ginecologia, cirurgia plástica, cirurgia geral, traumatologia) vêm corroborando com o efeito benéfico e a segurança do uso da pele da tilápia nas mais diversas situações clínicas. Além disso, existe a vantagem da pele da tilápia ser uma matéria-prima abundante em nosso país, o que pode ser comprovado através da seguinte informação publicada pelo site da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) no ano de 201727. "Entre 2005 e 2015, a produção do peixe mais cultivado no Brasil, a tilápia (Oreochromis niloticus), deu um salto de 223% com a modernização e a intensificação da produção tanto em tanques-rede em reservatórios como nos viveiros escavados. No ano de 2005, a produção de tilápia no País foi de 67.850,50 toneladas, de acordo com o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Já em 2015, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), calculou a produção da espécie em 219.329 t."

Deve acrescentar-se que a pele da tilápia é a primeira pele animal com registro solicitado no país, sendo responsável por colocar o Brasil em posição de destaque no cenário científico internacional, como pioneiro na produção deste tipo de material e o primeiro país no mundo a possuir um banco de pele de animal aquático.

Finalmente, todas as informações obtidas nos ensaios realizados até o momento demonstram o potencial da pele da tilápia como biocurativo e scaffold, e, desse modo, espera-se em breve apresentar para o mercado brasileiro e mundial um produto inovador, eficaz, seguro, de baixo custo, de uso extremamente versátil no campo da medicina e genuinamente brasileiro, idealizado e desenvolvido em todas as fases por pesquisadores e instituições do Brasil, produzido a partir de um subproduto que seria descartado.


REFERÊNCIAS

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Recebido em 20 de Outubro de 2020.
Aceito em 18 de Junho de 2021.

Local de realização do trabalho: Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil

Conflito de interesses: Os autores declaram não haver


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