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Efeito dos antioxidantes vitamina C e selênio em pacientes queimados: uma revisão bibliográfica

Effect of the antioxidants vitamin C and selenium in burned patients: a literature review

Aglaine de Oliveira Aguiar1; Bárbara Bruna Rodrigues de Oliveira2; Lunna Paula de Alencar Carnib1

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar o efeito dos antioxidantes vitamina C e o selênio em pacientes queimados, seus efeitos benéficos, bem como a melhor evoluçao clínica e o prognóstico desses pacientes.
MÉTODOS: O estudo é uma revisao bibliográfica simples nos bancos de dados eletrônicos Pubmed, Bireme, Medline e Scielo,no período de fevereiro de 2013 a abril de 2014. Foram selecionados 23 artigos para compor essa revisao. Como critério de seleçao, foram incluídos os artigos que continham palavras-chave como "queimaduras", "antioxidantes", "vitamina C", "selênio", "suplementaçao de antioxidantes em pacientes queimados", nos idiomas português e inglês e data de publicaçao entre janeiro de 2005 e dezembro de 2012.
RESULTADOS: A vitamina C atua na fase aquosa como um antioxidante sobre as EROs, mas nao é capaz de agir nos compartimentos lipofílicos para inibir a oxidaçao dos lipídios. Entretanto, esta pode captar os radicais de oxigênio, que age para formar peróxidos lipídicos. O selênio é um mineral que faz parte da enzima antioxidante glutamina peroxidase, que atua convertendo compostos tóxicos em atóxicos, resultando na reduçao de radicais livres.
CONCLUSAO: A terapia antioxidante com vitamina C e selênio parece promissora em atenuar os efeitos da produçao descontrolada de radicais livres em pacientes graves, acarretando possível diminuiçao do estresse oxidativo.

Palavras-chave: Queimaduras. Antioxidantes. Terapia Nutricional. Estresse Oxidativo.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To evaluate the effect of the antioxidants vitamin C and selenium in burned patients, their beneficial effects and better clinical outcome and prognosis.
METHODS: The study is a simple literature review in electronic databases Pubmed, Bireme, Medline and Scielo from February 2013 to April 2014. Twenty-three articles were selected to compose this review. As a selection criterion, the articles containing keywords like "burns", "antioxidants", "Vitamin C", "selenium", "antioxidant supplementation in burned patients", in Portuguese and English and publication date were included between January 2005 and December 2012.
RESULTS: Vitamin C acts in the aqueous phase as an antioxidant on ROS, but is not able to act in lipophilic compartments to inhibit the oxidation of lipids; however, it can capture the oxygen radicals, which acts to form lipid peroxides. Selenium is a mineral that is part of the antioxidant enzyme glutamine peroxidase, which acts converting toxic to nontoxic compounds, resulting in a reduction of free radicals.
CONCLUSION: The antioxidant therapy with vitamin C and selenium seems promising in mitigating the effects of uncontrolled free radical production in critically ill patients, leading to possible reduction of oxidative stress.

Keywords: Burns. Antioxidants. Nutrition Therapy. Oxidative Stress.

INTRODUÇAO

Queimadura é uma lesao causada por agentes térmicos, químicos, elétricos ou radioativos que agem no tecido de revestimento do corpo humano, podendo destruir parcial ou totalmente a pele e os seus anexos, até as camadas mais profundas, como tecidos subcutâneos, músculos, tendoes e ossos1.

As queimaduras sao lesoes cutâneas causadas pela açao direta ou indireta do calor e as principais causas sao a chama direta, o contato com água fervente ou líquidos quentes, chamado de escaldamento, o contato com superfície aquecida, a corrente elétrica e também por agentes químicos2.

As vítimas de queimaduras apresentam aumento acelerado em seu metabolismo, chegando a um gasto energético de até 50% acima do normal, em consequência de lesao extensa. O hipermetabolismo leva à perda exagerada de massa magra corporal, o que vem a causar a instalaçao da desnutriçao3.

A resposta ao estresse no paciente queimado é similar a qualquer doente crítico ou com trauma grave, diferenciando-se pela sua gravidade e duraçao. A resposta hipermetabólica após grandes queimaduras é caracterizada por resposta hiperdinâmica com aumento da temperatura corporal, do consumo de glicose e oxigênio, da formaçao de CO2, glicogenólise, lipólise e proteólise4.

As queimaduras sao acompanhadas por grandes mudanças metabólicas, imunes e endócrinas e, independentemente de sua causa, determinam lesoes locais e sistêmicas. Nas queimaduras pequenas, existe uma reaçao unicamente local, enquanto nas queimaduras moderadas e graves ocorre uma reaçao local maior, podendo ser acompanhada de graves repercussoes sistêmicas1.

O estresse oxidativo é definido como perda da homeostase entre a produçao de radicais livres e de antioxidantes, porque ocorre um aumento da produçao de radicais livres e uma deficiência de antioxidante5. O aumento do estresse oxidativo é um fenômeno frequentemente presente em doentes críticos, como consequência da elevada produçao de espécies reativas de oxigênio (EROs) e à rápida utilizaçao endógena das reservas de antioxidantes. Assiste-se a um aumento da geraçao de radicais livres associados a elevaçao da resposta inflamatória sistêmica, com consequências como a lesao celular, aumentando a falência de órgaos e a mortalidade6.

Em condiçoes clínicas como nas queimaduras, o estresse oxidativo é fator perpetuante da resposta inflamatória sistêmica, levando à piora progressiva do estado metabólico do paciente. A disfunçao múltipla de órgaos e sistemas muitas vezes se apresenta como complicaçao final em queimados graves, e está provavelmente relacionada à sequência de eventos que acontecem após a lesao. Dentre estes, a excessiva produçao de radicais livres desempenha importante papel no recrutamento de células inflamatórias e na disfunçao endotelial7.

A queimadura, com seus componentes de necrose celular, infecçao e ativaçao citoquímica, está primariamente caracterizada pelo desenvolvimento de uma reaçao inflamatória, induzindo uma resposta de fase aguda intensa. Também a produçao de radicais livres está associada com inflamaçao, e peróxidos lipídicos circulantes têm sido mostrados aumentados em pacientes queimados durante a primeira semana8.

A terapia nutricional do paciente crítico vem mudando seu enfoque ao longo dos últimos anos, convergindo para a busca da individualizaçao dos efeitos farmacológicos de cada nutriente específico. Desenvolveu-se o termo "imunonutriçao" para dietas contendo aminoácidos essenciais ou semiessenciais, nucleotídeos, ácidos graxos ômega 3 e antioxidantes9.

Assim, a compreensao dos mecanismos envolvidos na produçao excessiva de radicais livres em mecanismos fisiológicos, como fagocitose, reaçao inflamatória e fenômeno de isquemia/reperfusao, em indivíduos que sofreram queimaduras, é de suma importância para uma terapêutica adequada8.

Por evidências de que a terapia antioxidante tem participaçao positiva na reduçao do estresse oxidativo provocado pelos radicais livres, os quais possuem efeitos diretos no prolongamento da injúria de doentes críticos, o objetivo do estudo é avaliar o efeito dos antioxidantes vitamina C e o selênio, em pacientes queimados, seus efeitos benéficos, bem como a melhor evoluçao clínica e o prognóstico desses pacientes, que se apresentam com o estado geral comprometido.


MÉTODO

Tratou-se de um estudo de revisao bibliográfica simples nos bancos de dados eletrônicos Pubmed, Bireme, Medline e Scielo no período de fevereiro de 2013 a abril de 2014 de abordagem qualitativa e quantitativa. Foram encontradas cerca de 90 referências sobre o tema, sendo selecionados 23 artigos, os quais irao compor esta revisao. Como critério de seleçao, foram incluídos os artigos que continham palavras-chave como "queimaduras", "antioxidantes", "vitamina C", "selênio", "suplementaçao de antioxidantes em pacientes queimados", nos idiomas português e inglês e data de publicaçao entre janeiro de 2005 e dezembro de 2012. Foram excluídos os artigos que nao se encontraram no recorte temporal pré-determinado e em outro idioma.


RESULTADOS E DISCUSSAO

Antioxidantes nas Queimaduras


Durante o metabolismo normal, as chamadas substâncias antioxidantes sao os responsáveis em lidar com o estresse oxidativo. Tais substâncias sao divididas em: nao enzimáticas - como as vitaminas, o β-caroteno e as proteínas ligadas ao heme; sistemas enzimáticos - tais como a superóxido dismutase, catalase, glutationa-peroxidase, associadas à cofatores como o selênio, zinco, manganês e ferro9.

Situaçoes de estresse grave ultrapassam a capacidade de proteçao de nossos sistemas de defesa antioxidantes, acarretando danos celulares difusos, produzindo oxidaçao de proteínas, ácidos graxos poli-insaturados, polissacarídeos, ácidos nucleicos e resultam em necrose e disfunçao tissular10.

A resposta inflamatória e a proliferaçao de radicais livres de oxigênio afetam a interaçao, a excreçao, a utilizaçao, a distribuiçao e o depósito de vitaminas e minerais antioxidantes. Estudos recentes têm medido o estado antioxidante sérico total em grupos de pacientes graves, relatando níveis elevados de peróxidos lipídicos e reduçao expressiva nas defesas antioxidantes endógenas. As defesas antioxidantes protegem os tecidos e líquidos corpóreos da lesao causada pelos oxidantes produzidos pelo metabolismo normal ou pela resposta à inflamaçao e às doenças. Constituídas por ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa, substâncias hidrossolúveis e enzimas, derivam principalmente da dieta, como no caso das vitaminas E, C, betacaroteno, e dos elementos-traço zinco, cobre e selênio11.

Em pesquisa sobre as alteraçoes de elementos-traços antioxidantes no plasma em ratos queimados, foi observada uma diminuiçao significativa do selênio sérico no primeiro dia após o trauma. Como consequência, estratégias antioxidantes combinadas poderiam ser planejadas com objetivo de inibir a formaçao de radicais livres ou ainda interromper a cascata inflamatória, visando reduzir a lesao tecidual e melhorar a funçao orgânica12.

Em estudo realizado em ratos com 30% de superfície corporal queimada, foi observado o efeito da terapia antioxidante na imunossupressao, com administraçao de antioxidantes por sete dias. O autor demonstra que a queimadura foi profundamente imunossupressiva e a intervençao precoce com terapia antioxidante, capaz de restaurar a imunidade celular de maneira significativa. Estes dados coletivamente sustentam a hipótese de que o estresse oxidativo é um passo crítico na cascata nociva mediada pela queimadura, e sugere que estratégias antioxidantes direcionadas para inibiçao da produçao ou sequestro de radicais livres possam exercer um efeito protetor1.

Vitamina C

A vitamina C (ácido ascórbico) é considerada o principal antioxidante hidrossolúvel13. Esta vitamina atua na fase aquosa como um antioxidante sobre as EROs, mas nao é capaz de agir nos compartimentos lipofílicos para inibir a oxidaçao dos lipídios. Está disponível tanto no meio intra como extracelular da maior parte dos órgaos e com envolvimento direto nas defesas antioxidantes11.

Com esta açao antioxidante, o ascorbato pode captar os radicais de oxigênio, que de outra forma reagiriam para formar os peróxidos lipídicos. Por outro lado, estudos in vitro mostraram que essa vitamina, em baixa concentraçao e na presença de metais de transiçao, tais como ferro, pode atuar como molécula pró-oxidante e gerar H2O2 e .OH. No organismo humano, também está envolvida na reciclagem do α- tocoferil em α-tocoferol, resultando no radical ascorbil. A fraca reatividade deste radical é a razao para muitos de seus efeitos antioxidantes1.

O ácido ascórbico ou vitamina C é comumente encontrado em nosso organismo na forma de ascorbato. Por ser muito solúvel em água, está localizado nos compartimentos aquosos dos tecidos orgânicos. O ascorbato desempenha papéis metabólicos fundamentais no organismo humano, atuando como agente redutor, reduzindo metais de transiçao (em particular Fe3+ e Cu2+) presentes nos sítios ativos das enzimas ou nas formas livres no organismo. Por ser um bom agente redutor, o ascorbato pode ser oxidado pela maioria das espécies reativas de oxigênio (EROs) e nitrogênio (ERNs) que chegam ou sao formadas nos compartimentos aquosos dos tecidos orgânicos. Tendo em vista que o ascorbato converte as EROs e ERNs em espécies inofensivas e que os derivados do ascorbato sao pouco reativos, esse age como antioxidante in vivo. Devido a estas propriedades, muitos autores sugerem a ingestao diária de doses maiores de ascorbato para proteçao no tratamento de doenças crônicas, cardiovasculares, queimados e de alguns tipos de câncer14.

Selênio

O selênio ingerido, quer na forma orgânica quer inorgânica, é convertido pelo fígado em selenocisteína, usada na biossíntese de selenoproteínas, como a peroxídase da glutationa e a redutase da tioredoxina15.

Este mineral faz parte da enzima antioxidante, glutationaperoxidase, que atua no interior da célula convertendo compostos tóxicos, peróxido de hidrogênio, em atóxicos, água e O2, resultando na reduçao de radicais livres16.

O selênio é um mineral (oligoelemento) que também está relacionado com a proteçao, frente ao dano causado pelo estresse oxidativo. A literatura científica tem demonstrado que várias categorias de antioxidantes da dieta, dentre eles o selênio, podem ser efetivos em suprimir a ativaçao de vias pró-inflamatórias, por meio da quelaçao das moléculas de radicais livres17. Na pele, o selênio está presente como parte da redutase da tioredoxina e da peroxidase da glutationa, que partilham o papel principal na defesa celular contra o estresse oxidativo. Ambas as enzimas protegem a pele da formaçao de lesoes oxidativas, ao eliminarem diretamente as EROs e radicais livres. Estudos mostraram que a redutase da tioredoxina está localizada na membrana celular dos queratinócitos, fato que assume especial importância na proteçao contra a formaçao de lesoes por radicais livres15.

Em estudos realizados em ratos, o selênio esteve associado a atividade da glutationaperoxidase (GPx), que estava diminuída significativamente no plasma, com reduçao moderada no fígado e um aumento significativo no rim, onde a mesma é sintetizada. Os autores sugerem que estas alteraçoes podem estar refletindo um mecanismo adaptativo para neutralizar os efeitos deletérios das desordens metabólicas e do estresse oxidativo associado com a queimadura. Em consequência, a suplementaçao precoce combinada destes antioxidantes nao enzimáticos deveria ser considerada em pacientes queimados12. Portanto, em qualquer condiçao associada ao aumento do estresse oxidativo ou inflamatório, deve-se esperar uma influência dos níveis de selênio18.

Suplementaçao de antioxidantes no tratamento das queimaduras

A queimadura propicia o desenvolvimento de espécies reativas de oxigênio, contribuindo para danos teciduais secundários e prejuízo da funçao imune. Neste sentido, uma intervençao com uma suplementaçao de antioxidantes poderia atenuar essa produçao descontrolada das mesmas, contribuindo para melhor evoluçao clínica destes pacientes, uma vez que ajudaria a restaurar a imunidade celular e os prejuízos mediados pelos radicais livres, além de minimizar a destruiçao tecidual. Assim, estudos verificaram resultados satisfatórios na suplementaçao de vitamina C e selênio no estresse oxidativo e no tempo de reepitelizaçao de pacientes queimados1.

Em um ensaio clínico randomizado duplo cego com crianças queimadas (n=32), a suplementaçao de vitamina C reduziu significantemente o tempo de reepitelizaçao, além de proporcionar peroxidaçao lipídica e reduçao da capacidade antioxidante total estatisticamente menor no grupo estudo. Além disso, apesar de nao significante, o tempo de hospitalizaçao, o número e os dias de antibióticos/paciente foram inferiores para o grupo suplementado8.

Estudo realizado utilizando suplementaçao com complexo de vitamina C ressaltou o efeito positivo desse complexo na prevençao e modulaçao das consequências patológicas resultantes da açao de radicais livres, como a resposta imune aos efeitos imunossupressivos de fatores exógenos, como as queimaduras e a exposiçao à radiaçao ultravioleta. Este estudo é uma abertura na pesquisa da determinaçao de doses exatas e de protocolos de tratamento, para a açao destes agentes na sua prescriçao com finalidade antioxidante5.

Pesquisas avaliando as alteraçoes de elementos traços antioxidantes no plasma em ratos queimados observaram diminuiçao significativa do selênio sérico no primeiro dia após o trauma. Os autores sugerem que essa alteraçao pode estar refletindo um mecanismo adaptativo para neutralizar os efeitos deletérios das desordens metabólicas e do estresse oxidativo associado com a queimadura. Em consequência, a suplementaçao precoce combinada de antioxidantes deveria ser considerada em pacientes queimados12.

Pacientes queimados apresentam perda de aproximadamente 10% do conteúdo de selênio, devido às perdas exudativas; além disso, apresentam um grande gasto energético com consequente aumento das necessidades nutricionais, e uma alta incidência de infecçoes. Berger et al.19 desenvolveram um estudo em 20 pacientes queimados, no qual o grupo que recebeu suplementaçao com oligoelementos, incluindo o selênio, obteve uma menor incidência de infecçoes e de tempo de antibioticoterapia.

Em uma triagem clínica randomizada, com 20 pacientes grandes queimados, os autores estudaram os efeitos clínicos e imunológicos da suplementaçao de elementos traços (ET) como selênio. A conclusao dos autores é que a suplementaçao de ET parece ser benéfica após grandes queimaduras por estar associada com a diminuiçao significativa de infecçoes pulmonares e com menor tempo de internaçao hospitalar.

Ainda nao existem estudos abrangentes sobre qual dose, quando e por quanto tempo utilizaríamos antioxidantes. Em meta-análise, foram identificados cinco trabalhos sobre suplementaçao de selênio em pacientes críticos, indicando tendência de reduçao da mortalidade no grupo que recebeu doses elevadas de selênio (RR 0,79; 95%IC 0,59-1,04)20.

Em estudo com pacientes queimados, a suplementaçao de até 500 mg de selênio/dia, durante três semanas, pareceu segura e eficaz em queimados graves, resultando em maior número de leucócitos, reduçao da IL-6. Observou-se, também, reduçao do catabolismo proteico associada à melhora na cicatrizaçao de feridas e reduzida necessidade de cirurgia, diminuindo, assim, o tempo de UTI e internaçao hospitalar, mas a incidência de infecçoes na pele nao foi alterada. A via intravenosa foi a única maneira de fornecer as doses necessárias de antioxidantes. Estudos em queimados devem ser realizados para estabelecer a quantidade ideal do selênio na terapia nutricional21.

Grandes queimaduras induzem a uma grave depressao nos níveis de selênio, especialmente na primeira semana após o acidente. Estudos têm mostrado que os níveis séricos podem ser restaurados com a suplementaçao de elementos traços em quantidades de 6 a 8 vezes acima daquela recomendada pela RDA (Recommended Dietary Allowances) e associados com a diminuiçao significativa de infecçoes pulmonares e menor tempo de internaçao8.

A utilizaçao de um suplemento nutricional (500 ml - 250 kcal) enriquecido com antioxidantes (glutamina - 30 g, vitamina C - 1.500 mg, vitamina E - 500 mg, β caroteno -10 mg, zinco - 20 mg e selênio - 300 µg) foi avaliada em dois estudos com objetivo de observar os efeitos metabólicos e tolerância gastrointestinal do produto. Os resultados mostraram excelente tolerância gastrointestinal e nenhum efeito adverso do suplemento foi documentado. A suplementaçao também se mostrou segura e sem efeitos tóxicos, além de favorecer o processo de cicatrizaçao mais rápido desses pacientes1.

Assim, deve ser considerada a incorporaçao exógena de nutrientes antioxidantes a partir da combinaçao de vitaminas e oligoelementos, como as vitaminas antioxidantes e vitamina C, e os oligoelementos cofatores de enzimas, como o selênio, de modo a tentar neutralizar as ROS, prevenindo a ocorrência do estresse oxidativo e da lesao celular22,23.

As evidências de estresse oxidativo, lesao tecidual e induçao da resposta inflamatória sistêmica fornecem razoes biológicas para suplementaçao de antioxidantes em pacientes críticos. No entanto, a fisiopatologia dessa situaçao e o complexo trabalho dos sistemas de defesa antioxidantes têm limitado uma melhor visualizaçao e definiçao dessa terapêutica8.


CONCLUSAO

Os vários trabalhos publicados até o momento evidenciam a participaçao dos radicais livres no prolongamento da injúria. Ao mesmo tempo, cada vez mais, compreende-se que os antioxidantes podem promover uma proteçao para esse prejuízo; muito embora sejam poucos os trabalhos prospectivos e controlados que demonstrem conclusivamente os efeitos da suplementaçao na morbidade e mortalidade dos pacientes queimados, muitos destes correlacionam de forma positiva a utilizaçao da suplementaçao desses nutrientes e a ocorrência de vários benefícios como a melhor evoluçao clínica desses pacientes em situaçao de estresse metabólico.

A terapia antioxidante com vitamina C e selênio parece promissora em atenuar os efeitos da produçao descontrolada de radicais livres em pacientes graves, acarretando a possível diminuiçao do estresse oxidativo e, consequentemente, a reduçao do risco de complicaçoes infecciosas, melhor cicatrizaçao, menor tempo de utilizaçao de antibioticoterapia, menor agravo das lesoes teciduais, reduçao da peroxidaçao lipídica, além do menor tempo de permanência hospitalar. Essa terapia mostrou-se segura, sem efeitos adversos ou tóxicos para os pacientes. Porém, ainda sao necessários mais estudos que comprovem essa eficácia.


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1. Nutricionista formada pela Universidade Federal do Piauí, Teresina, PI, Brasil
2. Nutricionista formada pela Universidade Federal do Piauí, especialista em Saúde Pública, Teresina, PI, Brasil

Correspondência:
Aglaine de Oliveira Aguiar
Rua Mato Grosso, 1641, Bairro: Piçarra
Teresina, PI, Brasil. CEP: 64014-150
E-mail: aglaineaguiar@hotmail.com

Artigo recebido: 28/6/2014
Artigo aceito: 10/8/2014

Trabalho realizado na Universidade Federal do Piauí, Teresina, PI, Brasil.

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