1408
Visualizações
Acesso aberto Revisado por pares
Artigo Original

Caracterização dos atendimentos por queimaduras em um serviço de pronto-socorro

Burn profile at the emergency room

Karen Jeanne Cantarelli-Kantorski1; Caroline Lemos Martins2; Cândida Andolhe3; Alberto Luiz de Brum4; Daiane Dal Pai5; Maria Elena Echevarría-Guanilo6

RESUMO

OBJETIVO: Caracterizar os atendimentos por queimaduras, em um Pronto-Socorro do Sul do Brasil.
MÉTODO: Estudo quantitativo, descritivo e retrospectivo. A amostra foi constituída por 335 fichas de atendimentos realizados no período entre fevereiro de 2010 e janeiro de 2011. Variáveis sociodemográficas, características das queimaduras e condutas adotadas pelos profissionais foram analisadas por meio da estatística descritiva.
RESULTADOS: Houve predomínio de pacientes do sexo masculino (n=191) e adultos jovens (15-45 anos; n=181). Os líquidos superaquecidos foram os principais agentes causadores de lesoes térmicas (n=91). A realizaçao de curativos, aliada à prescriçao de medicamentos (n=187), foi a conduta profissional mais prevalente. Constatou-se que a maioria das fichas nao apresentava registros sobre encaminhamentos (n=291), profundidade (n=238) e extensao das queimaduras (n=335), regioes do corpo atingidas (n=211) e ambiente de ocorrência (n=381).
CONCLUSOES: A precariedade dos registros é um achado que deve ser valorizado pelos profissionais dos serviços no atendimento a pacientes com queimaduras.

Palavras-chave: Queimaduras. Serviços Médicos de Emergência. Registros Médicos.

ABSTRACT

AIM: To characterize burn attendances at Emergency Room of Southern Brazil.
METHOD: This quantitative, descriptive and retrospective study. The sample consisted of 335 records of burns during the period between February 2010 and January 2011. These were analyzed Sociodemographic informations, burns specific and professional actions adopted.
RESULTS: There was a predominance of males (n=191) and young adults (15-45 years, n=181). The main causative thermal agent was the hot liquids (n=91). The application of dressings and medicine prescription (n=187) was the most prevalent professional conduct. Most of the forms had no records of guiding (n=291), depth (n=238) and burn extent (n=335), body parts affected (n=211) and occurrence environment (n=381). The precariousness of the records is a preoccupation factor.
CONCLUSIONS: The precariousness of the records is a finding that should be valued by service professionals in the care of patients with burns.

Keywords: Burns. Emergency Medical Services. Medical Records.

INTRODUÇAO

As queimaduras sao agravos decorrentes de agentes térmicos, elétricos e químicos, para os quais se estima a ocorrência de 195.000 mortes a cada ano. As maiores taxas de mortalidade por queimaduras correspondem a crianças menores de 5 anos e idosos com mais de 70 anos. Apesar da elevada sobrevivência, a maioria dos pacientes enfrenta um longo período de recuperaçao, além da presença de limitaçoes físicas e emocionais1.

A Organizaçao Mundial de Saúde chama atençao para a frequência dos traumas por queimaduras em países de média e baixa renda, quando comparados aos traumas ocorridos em países desenvolvidos. Entre os principais aspectos apontados na reduçao dos traumas por queimaduras, encontram-se as políticas e condutas de prevençao adotadas pelo governo e a populaçao em geral1.

De forma geral, as lesoes por chama direta constituem-se na principal causa de morte por trauma térmico, sendo também comuns as queimaduras químicas e elétricas1. Os eventos ocorrem com maior frequência, em crianças e adultos jovens, do sexo masculino2, por líquidos superaquecidos2,3 e, em crianças, por chama direta, envolvendo, principalmente, o álcool líquido4. O domicílio é o ambiente de maior ocorrência de acidentes por queimaduras, para todas as faixas etárias, seguido do ambiente de trabalho nos adultos do sexo masculino4,5. Em relaçao aos acidentes de trabalho, os membros superiores e inferiores sao as regioes do corpo mais acometidas e os ambientes de comércio e indústria os locais de maior ocorrência envolvendo, principalmente, jovens entre 20 e 29 anos5.

O atendimento ao paciente queimado, realizado nos serviços de urgência e emergência, requer uma cuidadosa avaliaçao, na qual sejam incluídos a investigaçao do agente causal e o tempo de exposiçao, superfície corporal queimada, profundidade, regioes do corpo acometidas e ambiente de ocorrência do evento6,7. A avaliaçao desses indicadores de gravidade e o registro das condutas adotadas pelos profissionais de saúde que atuam nestes serviços definem o prognóstico e sao essenciais na continuidade do tratamento dos pacientes que sofreram queimaduras.

Na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul (RS), os atendimentos às pessoas com queimaduras sao realizados nas Unidades Básicas de Saúde e/ouno Pronto-Socorro de Pelotas (PS/Pelotas). A inexistência de informaçoes acerca da caracterizaçao dos atendimentos por queimaduras nessa cidade e regiao instigou a realizaçao desse estudo, uma vez que conhecer os dados epidemiológicos referentes à sua ocorrência contribuiria para a compreensao da magnitude do problema, definiçao da populaçao e situaçoes de risco para esses acidentes e o planejamento de açoes de educaçao direcionadas.

Apesar da necessidade de contar com dados precisos acerca da ocorrência de queimaduras a nível nacional, lamentavelmente, no Brasil, ainda nao se conta com um banco de dados unificado, que permita estimar a real situaçao da ocorrência destes acidentes no país. A elaboraçao de estudos com informaçoes locais, regionais e estaduais, representam importantes referências para o acompanhamento epidemiológico da ocorrência das queimaduras.

Prévio ao início das atividades de prevençao do Grupo de Extensao e Pesquisa em Queimaduras (GEPQ), vinculado à Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas, foi identificada a necessidade de conhecer a caracterizaçao dos atendimentos de pacientes queimados do pronto socorro da cidade, o qual é referência para indivíduos residentes no município e regiao, permitindo planejar açoes de prevençao. Apresente pesquisa teve como objetivo descrever a caracterizaçao dos atendimentos por queimaduras em um serviço de Pronto-Socorro do Sul do Brasil.


MÉTODO

Estudo de abordagem quantitativa do tipo descritivo e retrospectivo, realizado a partir da análise das fichas de atendimentos do Pronto-Socorro (PS) de Pelotas. O PS/Pelotas atende uma populaçao de 327.778 habitantes do município e cidades próximas.

Foram analisadas todas as fichas de atendimento de pacientes nas quais constava o diagnóstico de queimadura. A coleta de dados correspondeu ao período de fevereiro de 2010 a janeiro de 2011. Foram excluídas as fichas de atendimento que nao correspondiam a atendimentos por queimaduras e com registros ilegíveis.

Os dados foram coletados em instrumento, elaborado pelos pesquisadores e previamente submetido à apreciaçao de profissionais (um médico e quatro enfermeiros), os quais o consideraram adequado aos objetivos propostos. Por meio desse, foram coletadas variáveis sociodemográficas (sexo, faixa etária, cidade de procedência e forma de entrada no serviço), características relacionadas à queimadura (agente causal, grau da queimadura, superfície corporal queimada, regiao do corpo atingida e ambiente de ocorrência do acidente) e informaçoes sobre o atendimento (condutas no atendimento e encaminhamento para outros serviços de saúde).

Para a análise dos dados, foi seguida a Classificaçao Internacional de Doenças (CID-10). Dessa forma, fizeram parte da amostra os atendimentos de lesoes por queimaduras decorrentes de exposiçao a mudanças de temperatura, corrente elétrica, radiaçao, exposiçao à fumaça, fogo e chamas; e lesoes provenientes do contato com fonte de calor e substâncias quentes.

A coleta de dados ocorreu no mês de julho de 2011 por integrantes do GEPQ, que receberam treinamento prévio. Os dados foram digitados no programa Microsoft Office Excel 2007 e, em seguida, transportados e processados no programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versao 19.0, para obtençao das medidas de frequência e proporçoes.

O estudo recebeu aprovaçao do Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas (FEn/UFPel), sob o parecer número 225/2011 e autorizaçao da chefia da instituiçao para a coleta dos dados das fichas de atendimento.


RESULTADOS

O período analisado (fevereiro de 2010 a janeiro de 2011) corresponde a um total de 93.545 fichas de atendimento, das quais 436 (0,46%) foram identificadas como atendimentos por queimaduras. Ao considerar a CID-10, foram selecionadas 335 fichas de atendimento (76,83%) para compor a amostra deste estudo, uma vez que 101 (23,17) correspondiam a atendimentos por lesoes ocasionadas pelo contato da pele com taturanas/lagartas (Lonomia sp).

Identificou-se que, dos 335 atendimentos, 191 pacientes eram do sexo masculino. A média de idade foi de 27 anos para os homens e 26,4 para as mulheres. Para ambos os sexos, a faixa etária entre 15 e 45 anos correspondeu ao maior número de queimaduras (n=109 e n=72, respectivamente) (Tabela 1).




A maior demanda de atendimentos correspondeu a usuários que referiram o município de Pelotas (n=312) como cidade de moradia. Quanto à forma de entrada no PS/Pelotas, observou-se que a grande maioria (n=317) dos pacientes buscou alternativas próprias de deslocamento, como carro particular ou táxi; 10 pessoas foram transportadas pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e seis por meio de ambulâncias de outras cidades (Tabela 1).

Entre os agentes causais mais encontrados, destacou-se a categoria correspondente a líquidos superaquecidos (n=91) e explosao/chama direta (n=77). Esta informaçao nao foi identificada em 73 (21,8%) fichas de atendimento (Tabela 2). Os líquidos superaquecidos foram predominantes em pessoas na faixa etária de zero a 14 anos (n=42) e as queimaduras por explosao, chama direta e vapores (n=53) em indivíduos entre 15 e 45 anos (Tabela 2).




As queimaduras de 2º grau (n=153) obtiveram maior número de registros, porém, em 40,9% das fichas de atendimento nao constava informaçao referente à profundidade das lesoes. Quanto ao ambiente de ocorrência, o domicílio foi o mais frequente (n=31). Entretanto, essa informaçao também nao foi registrada na maior parte das fichas de atendimento analisadas (83,9%) (Tabela 3).




As regioes do corpo mais atingidas foram face e regiao cervical (n=125) e membros superiores (n=118). Destaca-se que muitos indivíduos apresentaram mais de uma regiao do corpo acometida (Tabela 3), nao sendo possível identificar o registro dessa informaçao em 23 fichas. Da mesma forma, informaçoes referentes à superfície corporal queimadanao foram passíveis de identificaçao.

No que diz respeito ao registro das condutas no atendimento de indivíduos queimados, 165 (49,3%) corresponderam à realizaçao de curativos e administraçao de medicamentos (como analgésicos e vacina antitetânica) (Tabela 4). Quanto à realizaçao de curativos foi possível identificar, em apenas 104 fichas, a cobertura prescrita, destacando-se a sulfadiazina de prata a 1% (n=84) e o acetato de retinol (n=12) como os mais utilizados.




Nos registros dos encaminhamentos dos pacientes para outros serviços de saúde, 21,2% foram referenciados ao serviço de Oftalmologia e 12,5%, para Unidades Básicas de Saúde. Observa-se ainda que, em 59,4% das fichas analisadas, nao houve registros sobre os encaminhamentos dos pacientes atendidos por queimaduras no PS/Pelotas para outros serviços de saúde (Tabela 4).

Finalizando, é importante destacar que na distribuiçao dos atendimentos, conforme as estaçoes do ano, identificou-se a ocorrência expressiva de acidentes nas estaçoes mais quentes, principalmente nos meses de fevereiro de 2010 (n=59) e janeiro de 2011 (n=101).


DISCUSSAO

A amostra analisada correspondeu a 335 (0,36%) atendimentos por queimaduras no Pronto-Socorro da cidade de Pelotas. Dados semelhantes foram analisados em um serviço de Pronto-Socorro de Porto Alegre - RS, no qual 0,47% dos atendimentos foram por queimaduras8.

Na literatura evidencia-se a prevalência de acidentes por queimaduras no sexo masculino5,9-11, tanto em crianças como em adultos jovens12,13; crianças menores de 10 anos (22%) e jovens considerados em idade produtiva (20 a 29 anos; 23,1%)5. A ocorrência destes acidentes entre adultos jovens torna-se um aspecto preocupante, uma vez que as queimaduras estariam relacionadas ao exercício de atividades ocupacionais que implicam em maior exposiçao a riscos14, e demandariam maior necessidade de fiscalizaçao no que diz respeito a materiais de proteçao adequados às atividades desenvolvidas.

Na literatura, identifica-se que nas queimaduras ocorridas entre crianças e jovens, os líquidos superaquecidos sao identificados como os agentes etiológicos mais frequentes3,4,12 e, entre os adultos e idosos, a chama direta provinda, principalmente, da combustao de álcool líquido4 e líquidos superaquecidos2,10.

No atendimento à vítima de queimadura, informaçoes como o agente causal, superfície corporal queimada, profundidade, regiao do corpo atingida e ambiente de ocorrência do acidente sao essenciais para a correta avaliaçao da gravidade e encaminhamento para atendimento em unidades especializadas6,15.

A avaliaçao da profundidade e extensao da queimadura determina o conhecimento sobre sua gravidade6,15, assim como, o contexto em que esta ocorreu (local aberto ou fechado, abuso de substâncias ou tentativa de suicídio), subsidiando a abordagem a ser realizada nafase aguda e orientando as condutas adotadas pelos profissionais de saúde na fase de recuperaçao. Contudo, nesta pesquisa, em decorrência da precariedade dos registros das fichas de atendimento analisadas, nao foi possível determinar a média de superfície corporal queimada, uma vez que a equipe de profissionais do serviço registram estas informaçoes sem protocolos padronizados pelo serviço.

Quanto ao ambiente de ocorrência, o domicílio foi o mais frequente (n=31). Entretanto, essas informaçoes nao foram registradas em 281 (83,9%) fichas de atendimento analisadas (Tabela 3). Na indagaçao das circunstâncias em que aconteceram os acidentes, quando ocorrido em ambiente fechado, como a cozinha, deve-se suspeitar de lesao por inalaçao de fumaça, associada à perda de consciência, queimaduras faciais e grandes SCQs16.

Ainda, em relaçao ao ambiente, na literatura identifica-se a ocorrência de acidentes por queimaduras em crianças, em diferentes horários e distintas estaçoes do ano. Na China, há a predominância de lesoes na estaçao de verao, no período das 08:00 às 11:59 horas e das 16:00 às 17:59 horas9. No Brasil, na Cidade de Sao Paulo, constatou-se maior incidência de queimaduras durante a primavera (38,6%)14 e, na cidade de Tubarao, no Estado de Santa Catarina, na estaçao do outono (42,9%), seguida do verao (23,8%), primavera (19%) e inverno (14,3%)17.

Embora estudos anteriores já investigassem o impacto do clima e fatores temporais na incidência de admissoes por traumas em serviços de urgência e emergência, há uma escassez de dados que descrevem o efeito da mudança sazonal dos atendimentos por queimaduras18. O verao e o inverno sao consideradas as estaçoes do ano de maior utilizaçao de recursos (necessidade de internaçao e permanência hospitalar) de centros de atençao a indivíduos queimados19.

Para melhorar a eficiência operacional e maximizar o atendimento aos pacientes, autores19 apontam a necessidade de alocaçao de recursos visando antecipar as mudanças sazonais, de forma que a oferta de serviços corresponda à real demanda nos períodos de maior incidência de traumas por queimaduras. Entretanto, ressaltase que ao interpretar dados como esses, especialmente quando o objetivo é o planejamento de açoes preventivas, é importante considerar que a ocorrência de queimaduras pode estar relacionada aos comportamentos adotados pelos indivíduos e influenciadas pelas diferenças climáticas e/ou culturais de cada regiao e/ou país.

Considera-se, ainda, a coincidência dos acidentes com o período de férias escolares e o aumento do tempo de permanência de crianças e adolescentes em casa. Contudo, independentemente do momento ou do período em que as queimaduras ocorrem, é importante destacar que a maior parte dos acidentes envolvendo crianças ocorre na presença dos pais ou responsáveis que, no momento do acidente, realizavam outras atividades no mesmo ambiente12.

Em relaçao às regioes do corpo mais atingidas, na literatura, esta informaçao é variada, destacando-se entre os homens, as regioes de cabeça e pescoço (26,4%) e membros superiores (26,6%) e, entre as mulheres, os membros superiores (34,4%) e inferiores (24,1%)5. Ainda, autores1,18 destacam que as queimaduras possuem menor gravidade em países desenvolvidos, devido à adoçao de comportamentos seguros por parte da populaçao, incentivados pelo governo, profissionais de saúde e populaçao em geral para prevençao de acidentes e reduçao de sequelas.

A análise da forma de entrada dos pacientes com queimaduras ao PS/Pelotaspermitiu identificar que a maior parte dos indivíduos (n=317) buscou alternativas próprias de deslocamento, por exemplo, taxi ou carro particular. Autores20-22 apontaram que para chegar aos serviços de emergência a maioria dos usuários opta pela utilizaçao de meios próprios de deslocamento, apontando como principal motivador dessa escolha a demora do atendimento dos serviços de saúde móveis.

A utilizaçao de sulfadiazina de prata a 1% como terapia tópica no tratamento de lesoes por queimaduras também foi encontrada em outros estudos2,23, sendo indicada devido às propriedades bacteriostáticas. Destaca-se que, atualmente, estao disponíveis coberturas modernas, efetivas e menos traumáticas no momento da troca, porém, apresentam altos custos financeiros e sao pouco conhecidas pelos profissionais de saúde. Ainda, no que diz respeito às coberturas, deve-se considerar o custo e o tempo de permanência e recuperaçao dos pacientes.

Embora o PS/Pelotas seja um serviço de média complexidade e possua papel de ordenador das urgências no município de Pelotas e regiao, encaminhando os usuários, após o primeiro atendimento e estabilizaçao - conforme as necessidades de tratamento, para serviços especializados (unidades ambulatoriais ou hospitalares) -, é importante destacar a importância do primeiro atendimento e a comunicaçao deste serviço com centros especializados. Essa comunicaçao deve estar voltada para a escolha conjunta do tratamento, incluindo acobertura/curativo adequado para a recuperaçao das lesoes. O paciente atendido neste serviço poderá ter a continuidade do seu tratamento ao ser encaminhado ao centro especializado ou UBS, conforme a necessidade.

Em um centro de urgência e emergência do Brasil, a falta de registros no que se refere à superfície corporal queimada, profundidade e localizaçao das queimaduras também foi descrita4. Autores, ao realizarem pesquisa sobre a Classificaçao de Risco no PS/Pelotas no mesmo ano, também evidenciaram registros incompletos22. Dessa forma, confirma-se a necessidade do aprimoramento do registro e da coleta destas informaçoes durante o atendimento ao paciente vítima de trauma22. A precariedade das anotaçoes nas fichas de atendimento analisadas pode expressar o desconhecimento dos profissionais de saúde acerca dos registros nas fichas dos pacientes queimados, a falta de conscientizaçao quanto à necessidade de informaçoes consistentes sobre o acidente e o atendimento prestado4 ou a falta de utilizaçao de protocolos ou formulários específicos para o atendimento às queimaduras6,15 no serviço pesquisado.

Ao analisar os registros de atendimento de mulheres vítimas de agressao, em um serviço de Pronto-Socorro, autores24 revelam que registros incompletos e/ou inexistentes impossibilitaram a análise detalhada, por exemplo, das circunstâncias dos eventos, dos atendimentos prestados no serviço e encaminhamentos21. Nesse sentido, destaca-se a necessidade de maior precisao nos registros profissionais, os quais devem ser embasados em anamnese e exames físicos rigorosos.

Embora a maioria dos pacientes acometidos por queimaduras, participantes do presente estudo, nao requeira tratamento sob regime de internaçao, esses necessitam de avaliaçao de profissionais de saúde especializados em razao da possibilidade de surgimento de sequelas físicas e/ou psicológicas23 e do risco de complicaçoes devido a infecçoes.

Evidencia-se a necessidade de qualificaçao dos registros realizados pelos profissionais de saúde envolvidos no atendimento ao paciente queimado, assim como em outras condiçoes atendidas no Pronto-Socorro em questao22. Cabe destacar, que estas informaçoes além de ser indicadores de gravidade do quadro clínico, orientam açoes que podem ser realizadas em etapas posteriores, favorecendo o prognóstico dos pacientes e a prevençao de futuros agravos.


CONCLUSAO

Ao analisar as fichas de atendimento de pacientes no PS/Pelotas referentes ao período de fevereiro de 2010 a janeiro de 2011, foram evidenciados 436 atendimentos por queimaduras, contudo, 335 fichas de atendimento por queimaduras foram analisadas no presente estudo por contemplarem diagnósticos do CID-10.

Houve predomínio de pacientes do sexo masculino, adultos jovens e usuários procedentes do município de Pelotas. Entre os agentes causais, os líquidos superaquecidos e explosao/chama direta foram responsáveis pela maioria das queimaduras, apresentando-se como importante fator para adoçao de açoes preventivas. A realizaçao de curativos, aliada à prescriçao de medicamentos, foi a conduta mais prevalente, com destaque para o uso da sulfadiazina de prata a 1%, administraçao de analgésicos e vacina antitetânica.

Identificou-se acarência de informaçoes, na maioria das fichas de atendimento analisadas em relaçao ao grau e extensao das queimaduras, regioes do corpo atingidas, ambientes de ocorrência e encaminhamentos para outros serviços de saúde, sendo considerada uma limitaçao deste estudo para a caracterizaçao dos atendimentos por queimaduras no PS/Pelotas.

Esta pesquisa contribui para a reflexao e conscientizaçao dos profissionais de saúde que atuam em serviços de urgência e emergência sobre a necessidade do adequado preenchimento das fichas de atendimento de pacientes queimados, Finalmente, considera-se importante a realizaçao de estudos multicêntricos, de forma a permitir o conhecimento do perfil de atendimentos por queimaduras nas distintas regioes do país. Ainda, dados como esses podem contribuir para a elaboraçao de protocolos de atendimentos específicos às queimaduras, assim como de propostas de açoes de prevençao específicas para cada regiao do país.


REFERENCIAS

1. World Health Organization. Violence and Injury Prevention. Burns. 2014 [Acesso 19 fev 2014]. Disponível em: http://www.who.int/violence_injury_prevention/other_injury/burns/en/

2. Montes SF, Barbosa MH, Neto ALS. Aspectos clínicos e epidemiológicos de pacientes queimados internados em um Hospital de Ensino. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(2):369-73.

3. Machado THS, Lobo JA, Pimentel PCM, Serra MCVF. Estudo epidemiológico das crianças queimadas de 0-15 anos atendidas no Hospital Geral do Andaraí, durante o período de 1997 a 2007. Rev Bras Queimaduras. 2009;8(1):3-9.

4. Balan MAJ, Oliveira MLF, Trassi G. Características das vítimas de queimaduras atendidas em unidade de emergência de um hospital escola do Noroeste do Paraná. Cienc Cuid Saude. 2009;8(2):169-75.

5. GawryszewskiVP, Bernal RTI, Silva NN, Neto OLM, Silva MMA, Mascarenhas MDM,et al. Atendimentos decorrentes de queimaduras em serviços públicos de emergência no Brasil, 2009. Cad Saúde Pública. 2012;28(4):629-40.

6. Kearns RD, Cairns CB, Holmes JH 4th, Rich PB, Cairns BA. Thermal burn care: a review of best practices. What should prehospital providers do for these patients? EMS World. 2013;42(1):43-51.

7. Branfoot T. Consensus on the pre-hospital approach to bums patient management. Injury. 2006;37(7):668-9.

8. Bervian F, Maino MM, Schmidt MK, Silva VBG, Arnt R, Martins PDE. Estudo de mortalidade em pacientes tratados na unidade de queimados no hospital de pronto socorro de Porto Alegre. ACM Arq Catarin Med. 2007;36(supl. 1):173-4.

9. Chen XL, Guo F, Liang X, Wang F, Wang YJ, Sun YX.Burns caused by alcohol-based fires in the household coal stove in Anhui Province, China. Burns. 2010;36(6):861-70.

10. Echevarria-Guanilo ME, Dantas RA, Farina JA Jr, Alonso J, Rajmil L, Rossi LA. Reliability and validity of the Impact of Event Scale (IES): version for Brazilian burn victims. J Clin Nurs. 2011;20(11-12):1588-97.

11. Adejumo PO, Akese MI.A five-year prevalence study of burn injury in a Nigerian teaching hospital. World Hosp Health Serv. 2012;48(1):31-4.

12. Vendrusculo TM, Balieiro CRB, Echevarría-Guanilo ME, Farina JA Jr, Rossi LA. Queimaduras em ambiente doméstico: características e circunstância do acidente. 1. Rev Latinoam Enferm. 2010;18(3):444-51.

13. Malta DC, Mascarenhas MDMD, Silva MMA, Macário EM. Perfil dos atendimentos de emergência por acidentes envolvendo crianças menores de dez anos: Brasil, 2006 a 2007. Cien Saude Colet. 2009;14(5):1669-79.

14. Lacerda LA, Carneiro AC, Oliveira AF, Gragnani A, Ferreira LM. Estudo epidemiológico da Unidade de Tratamento de Queimaduras da Universidade Federal de Sao Paulo.Rev Bras Queimaduras. 2010;9(3):82-8.

15. Walker A, Baumber R, Robson B. Pre-hospital management of burns by the UK fire service. Emerg Med J. 2005;22(3):205-8.

16. Antonio ACP, Castro PS, Freire LO. Lesao por inalaçao de fumaça em ambientes fechados: uma atualizaçao. J Bras Pneumol. 2013;39(3):373-81.

17. Pereira Júnior S, Ely JB, Sakae TM, Nolla A, Mendes FD. Estudo de pacientes vítimas de queimaduras internados no Hospital Nossa Senhora da Conceiçao em Tubarao - SC. ACM Arq Catarin Med. 2007;36(2):22-7.

18. Teo AI, Van As AB, Cooper J. A comparison of the epidemiology of paediatric burns in Scotland and South Africa. Burns. 2012;38(6):802-6.

19. Hultman CS, Tong WT, Surrusco M, Roden KS, Kiser M, Cairns BA. To everything there is a season: impact of seasonalchange on admissions, acuity of injury, length of stay, throughput, and charges at an accredited, regional burn 1. center. Ann Plast Surg. 2012;69(1):30-4.

20. Carret MLV, Fassa ACG, Paniz VMV, Soares PC. Características da demanda do serviço de saúde de emergência no Sul do Brasil. Ciênc Saúde Colet. 2011;16(Supl. 1):1069-79.

21. Araujo MT, Ferreira AR, Rocha TB. Perfil dos usuários e suas demandas em uma unidade de atendimento imediato. RECENF. 2010;8(25):178-86.

22. Tomberg JO, Cantarelli KJ, Guanilo MEE, Dal Pai D. Acolhimento com avaliaçao e classificaçao de risco no pronto socorro: caracterizaçao dos atendimentos. Cienc Cuid Saude. 2013;12(1):80-7.

23. Ragonha ACO, Ferreira E, Andrade D, Rossi LA. Avaliaçao microbiológica de coberturas com sulfadiazina de prata a 1%, utilizada em coberturas. Rev Latinoam Enferm. 2005;13(4):514-21.

24. Ilha MM, Leal SMC, Soares JSF. Mulheres internadas por agressao em um hospital de pronto socorro: (in)visibilidade da violência. Rev Gaúch Enferm. 2010;31(2):328-34.











1. Enfermeira Integrante do GEPQ. MestreemEnfermagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil
2. Enfermeira. Doutoranda do Programa de Pós-GraduaçaoemEnfermagem da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas (PPGEn- FEn/UFPel), Pelotas, RS, Brasil
3. Enfermeira, Rio Grande, RS, Brasil
4. Gerente de Enfermagem do Pronto Socorro de Pelotas/RS,Pelotas, RS, Brasil
5. Enfermeira. Doutoraem Enfermagem pela UFRGS. Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem da UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil
6. Enfermeira. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina/SC. Brasil. Coordenadora do Grupo de Extensao e Pesquisa (GEPQ). Florianópolis, SC, Brasil

Correspondência:
Karen Jeanne Cantarelli-Kantorski
R. Embira, 170, casa 01. Bairro Hípica
Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 91755-656
E-mail: kjcantarelli@yahoo.com.br

Artigo recebido: 14/6/2014
Artigo aceito: 5/8/2014

Trabalho realizado na Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.

© 2024 Todos os Direitos Reservados