RESUMO
OBJETIVO: Realizar revisao da literatura sobre os índices estatísticos de acidentes com queimaduras no Brasil, identificando o perfil epidemiológico da populaçao que sofre queimaduras; analisando as principais causas de queimaduras e identificando os fatores: graus, idade, local, agente causal e sexo mais acometido.
MÉTODO: Foi realizado levantamento bibliográfico por meio de publicaçoes de periódicos indexados (MEDLINE, LILACS, SciELO e PubMed), no período de 2000 a 2011, com enfoque no tema em questao.
RESULTADOS: Há maior enfoque sobre tipos, profundidade e extensao da queimadura, áreas atingidas, sequelas, circunstâncias do acidente, local de ocorrência e presença ou nao do responsável no momento do acidente. Poucos estudos focalizam a perspectiva dos pais ou responsáveis pela vítima sobre os possíveis aspectos que podem ter levado à ocorrência do acidente.
CONCLUSAO: O estudo mostrou o quanto sao necessários mais estudos específicos sobre o perfil do queimado e a importância da aplicaçao efetiva de programas de prevençao a queimaduras que possam atingir os lares e escolas, objetivando a queda de índices de queimaduras nos domicílios e o principal afetado, as crianças.
Palavras-chave:
Perfil epidemiológico. Queimaduras. Literatura de revisão como assunto.
ABSTRACT
OBJECTIVE: To review the literature on the statistical indices of accidents with burns in Brazil, identifying the epidemiological profile of the population that suffers burns; analyzing the main causes of burns and identify factors: grades, age, location, sex and more causal agent affected.
METHODS: We conducted a literature through publications in indexed journals (MEDLINE, LILACS, SciELO and PubMed) in the period from 2000 to 2011, focusing on the issue at hand.
RESULTS: There is greater focus on types, depth and extent of the burn, the affected areas, sequels, circumstances of the accident, place of occurrence and the presence or absence of charge at the time of the accident. Few studies focus on the perspective of parents or guardians by the victim about the possible issues that may have led to the accident.
CONCLUSION: The study showed how much more research is needed on the specific profile of the burned and the importance of implementing effective prevention programs to burns that can reach the homes and schools, aiming to drop rates in households and burns primarily affected, the child.
Keywords:
Epidemiological profile. Burns. Review literature as topic.
As queimaduras constituem um importante problema de saúde pública, representando a segunda causa de morte na infância nao só nos Estados Unidos como também no Brasil. Porém, existem poucos dados e informaçoes disponíveis para orientar programas de prevençao1.
Os acidentes geram enormes gastos financeiros e sao responsáveis por sequelas psicológicas e sociais ao acidentado, bem como à sua família2. A maioria deles ocorre em casa e sao atribuídos a lapsos na atençao aos perigos domésticos3.
A maioria das queimaduras em crianças que acontecem em ambientes domésticos é provocada por líquidos superaquecidos1. Estudos demonstraram que a prevalência do trauma térmico foi maior em torno de 1 a 2 anos de idade, e que o principal agente causador é a água quente, com cerca de 37,1% de casos entre a faixa etária de 0 a 5 anos4.
Poucas sao as doenças que trazem sequelas tao importantes como a queimadura. Mesmo com a sobrevivência física, as cicatrizes e as contraturas culminam, com frequência, na distorçao da imagem, que será levada para sempre5. Dessa forma, é de fundamental importância a prevençao, encarando a queimadura como um acidente grave que pode ser evitado por meio da aplicaçao de princípios epidemiológicos, realizaçao de campanhas de conscientizaçao e programas educativos6.
Estima-se que, no Brasil, ocorram em torno de 1.000.000 de acidentes com queimaduras por ano. Destes, 100.000 pacientes procurarao atendimento hospitalar e cerca de 2.500 irao falecer direta ou indiretamente de suas lesoes7.
Segundo Willer et al.8, a escola é, certamente, um dos locais mais propícios para se receber informaçao de prevençao. Mesmo considerando-se que, na idade escolar, a maioria dos acidentes ocorre fora da escola, é recomendado que as escolas participem ativamente na prevençao dos acidentes, criem comissoes de prevençao de acidentes e tenham um papel de agente formador de conhecimentos.
A regiao Norte é aparentemente, dentre todas as regioes do país, a que contribui com os menores números nas estatísticas sobre o assunto, representando aproximadamente 7,5% das internaçoes em virtude desse agravo no período de 1999 a 2001, tendo também a menor taxa de mortalidade da federaçao (0,90%). O Pará, por sua vez, é, na regiao Norte, a Unidade Federal com piores indicadores em relaçao às queimaduras9.
MÉTODOA pesquisa caracteriza-se como revisao bibliográfica, secundária, retrospectiva e descritiva. Quanto ao tipo de publicaçao, foram considerados apenas os periódicos; em relaçao à procedência fizeram parte periódicos nacionais publicados no período de 2000 a 2011, nas bases de dados: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS),
U.S. National Institute of Health (PubMed),
Scientific Electronic Library Online (SciELO) e
Literatura Internacional em Ciências da Saúde (MEDLINE).
Para identificar as publicaçoes indexadas nessas bases de dados, foram utilizados os seguintes descritores: fisioterapia, queimadura, causas das queimaduras, epidemiologia das queimaduras, juntos e separados.
Como resultados da presente pesquisa, foram obtidos oito artigos, sendo quatro retrospectivos; dois quantitativos, descritivos e transversais; um artigo de revisao e um observacional do tipo série de casos.
DISCUSSAONas publicaçoes sobre a epidemiologia das queimaduras, há maior enfoque sobre tipos, profundidade e extensao da queimadura, áreas atingidas, sequelas, circunstâncias do acidente, local de ocorrência e presença ou nao do responsável no momento do acidente. Poucos estudos focalizam a perspectiva dos pais ou responsáveis pela vítima sobre os possíveis aspectos que podem ter levado à ocorrência do acidente10.
Dentre todas as hospitalizaçoes por causas externas contabilizadas pelo SUS (Sistema Unico de Saúde) no ano de 2000, as queimaduras foram responsáveis por 28.843 internaçoes, o que correspondeu a 4,4% do total11.
Segundo apuraçao da Sociedade Brasileira de Queimaduras, divulgada em 2003 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), ocorrem cerca de 300.000 casos de queimaduras de crianças por ano no país12.
Em estudo retrospectivo realizado por Arrunátegui13, observou- se que dos 1.165 pacientes acometidos por acidentes com queimaduras, as crianças foram as mais frequentemente acometidas, com 413 casos, sendo 58,5% do sexo masculino. Os dados sao correspondem aos de Martins & Andrade14, que realizaram um estudo transversal e descritivo acerca da morbidade hospitalar e da mortalidade por queimaduras, no qual foram estudados 182 casos de queimaduras em menores de 15 anos, também havendo predomínio de casos do sexo masculino (56,6%) e a idade de maior incidência foi 1 ano (coeficiente de 6,1 por 1.000 crianças).
Cruvinel et al.15 realizaram um trabalho com 268 pacientes queimados no período de abril de 2000 a março 2001, no Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de Uberlândia, MG, Brasil. Apurou-se que crianças menores de 16 anos e adultos entre 31 e 40 anos de idade foram os mais lesados, havendo predomínio de queimaduras em crianças do sexo feminino e adultos do sexo masculino.
O estudo realizado por Arrunátegui13 apontou que a idade média dos acidentados por queimaduras foi de 25,87 anos, aproximando os dados com o estudo de Cruvinel et al.15, o qual demonstrou que a média de idade foi de 26,2 anos.
Montes et al.16, em estudo retrospectivo, descritivo com abordagem quantitativa, identificaram 346 prontuários e fichas do Pronto Socorro de vítimas de queimaduras atendidos no Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (HC/UFTM), no período de janeiro de 2003 a dezembro de 2007. Destes, 138 pacientes permaneceram internados, sendo 98 (71,0%) do gênero masculino, e a média de idade foi de 26,1 anos (mínima 10 meses e máxima 76 anos), sendo 46 (33,3%) de 0 a 14 anos, 85 (61,6%) de 14 a 59 anos e sete (5,1%) de 60 anos e mais.
Leao et al.17 analisaram o perfil epidemiológico de 687 pacientes internados na Unidade de Tratamento de Queimados Prof. Ivo Pitanguy, no período de fevereiro de 2009 a julho de 2010, tendo a média de idade de 29 anos. Já Balan et al.18, nos meses de janeiro a dezembro de 2006, realizaram 108 atendimentos a indivíduos com queimaduras na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Hospital Universitário Regional de Maringá (HUM). Observou-se que o sexo masculino foi o mais acometido (61%) e a idade variou de seis meses a 82 anos, com média de 30,39 anos (SD±17,65).
A faixa etária de maior índice, independentemente do sexo, foi de 20 a 39 anos (47%); nos extremos de idade, aparecem meninos abaixo de 10 anos (12%) e pessoas do sexo feminino acima de 60 anos (6%).
Em relaçao ao gênero, Arrunátegui13 observou em seu estudo que, entre os internados com queimaduras em fase aguda de tratamento, 437 pacientes eram do sexo feminino e 728 do sexo masculino, com idades que variaram de 0 a 97 anos, contradizendo o estudo realizado por Martins & Andrade14, que obteve o predomínio de casos de acidentes com o sexo masculino, ficando em 56,6% e confirmando os dados com os estudos realizados por Cruvinel et al.15, Montes et al.16, Leao et al.17 e Balan et al.18, que apontam o gênero masculino como o mais acometido por acidentes com queimaduras.
Vários estudos desenvolvidos no Brasil, tanto em hospitais gerais quanto em centros especializados, apontam o sexo masculino como o mais frequentemente atingido19.
Coutinho et al.20, em estudo de revisao de prontuários, tendo como objetivo revelar aspectos epidemiológicos relativos aos pacientes internados na enfermaria de queimados da Associaçao Beneficente de Campo Grande Santa Casa/MS, avaliaram os dados obtidos a partir de registro das internaçoes de pacientes do período de janeiro de 2004 a dezembro de 2008, perfazendo um total de 977 pacientes. Os autores demonstraram maior predominância de indivíduos do sexo masculino (61,41%) sobre o sexo feminino (38,59%).
Vendrusculo et al.21 buscaram caracterizar em seu estudo os acidentes por queimaduras, ocorridos em ambiente doméstico e identificar as circunstâncias desses acidentes quando atingiram crianças, adultos ou idosos que necessitavam de supervisao. Foram coletados, nesse estudo, dados demográficos sobre o trauma de 61 vítimas de queimaduras em ambiente doméstico. O estudo demonstrou que a cozinha foi o local onde ocorreu a maior parte dos acidentes nesse grupo. E foram identificados dois núcleos temáticos: fatores que podem ter contribuído para a ocorrência de acidentes por queimaduras: sociais e ambientais e circunstâncias que envolveram o acidente. Os fatores de risco foram: baixo nível socioeconômico e de instruçao das maes e responsáveis pela criança, no momento do acidente, moradias pequenas para o número de residentes e equipamentos de cozinha precários. Nao foram identificados casos de violência doméstica, mas de desatençao dos responsáveis.
Acidentes com água, café e sopa aquecidos sugerem que a cozinha doméstica seja o local com maior número de acidentes, fato demonstrado por outros estudos22,23.
Montes et al.24 relataram em seu estudo que 63 (45,7%) das lesoes ocorreram no domicílio e que 93 (67,4%) eram de natureza acidental e a principal causa de queimadura 68 (49,3%) foi a chama aberta. Considerando por faixa etária, temos como principal causa o escaldamento entre os pacientes de zero a 14 anos e a chama aberta nas demais faixas etárias.
Já Balan et al.18 afirmam que o agente térmico é o maior causador de queimaduras, seguido pelos agentes químico e elétrico. O contato com líquido superaquecido é apontado como a maior causa. E confirmam que estudos nacionais e internacionais têm apontado o domicílio como local de maior ocorrência de acidentes resultantes em queimaduras de pele. De forma geral, os acidentes domésticos sao os mais frequentes em indivíduos de ambos os sexos, tornando evidente que atitudes educativas de prevençao devem ser adotadas para esses casos.
Quanto ao agente etiológico das queimaduras, Arrunátegui13 demonstra em seu estudo que as queimaduras com álcool responderam por 23,7% dos casos. O álcool, sozinho, foi o principal agente causador de hospitalizaçao em todas as faixas etárias, exceto de 0 a 4 anos, na qual houve predomínio dos escaldos. Queimaduras térmicas foram as mais comuns, tendo acometido 972 pacientes, seguidas pelas causas por agentes elétricos (140), nao especificados (30), químicos (23) e radioativos (0). Constatou-se que 311 pacientes tiveram queimaduras com álcool, o que correspondeu a 26,7% do total geral.
Martins & Andrade14 observaram que 34,6% dos acidentados por queimaduras estavam na faixa etária de 10 a 14 anos de idade e identificaram o álcool (30,8%), a gasolina (15,4%) e o querosene (11,5%) como os principais agentes responsáveis por essa categoria de queimaduras.
No estudo conduzido por Leao et al.17, álcool líquido apresentou maior incidência, acometendo 236 (34,4%) pacientes, seguido pelos líquidos superaquecidos (28,1%), destacando-se, entre eles, a água e o óleo, e, em terceiro lugar, a chama direta, responsável por 17,6% dos casos de queimaduras. Ficou evidenciado, também, que o álcool é o principal agente etiológico dos pacientes internados a partir dos 5 anos de idade, sendo a escaldadura o agente mais prevalente em crianças até 4 anos de idade.
Para Balan et al.18, o agente térmico foi a causa de queimadura em 77 (82%) indivíduos; destes, 52 (68%) casos ocorreram pelo contato com líquidos superaquecidos, gerando, na maioria deles, lesoes de 1º (25%) e 2º (19%) graus; e as queimaduras por álcool, gerando lesoes de 2º grau (60%).
As regioes corporais mais atingidas foram os membros superiores, tendo sido lesados em 97 (70,3%) pacientes. Quanto à profundidade das lesoes, 60 (43,5%) pacientes apresentaram queimadura de 1º grau, 122 (88,4%) de 2º grau e 38 (27,5%) de 3º grau e, em 81 (58,7%) indivíduos, verificaram-se lesoes de graus distintos de profundidade, dados similares aos encontrados por Montes et al.24.
A média de superfície corporal queimada obtida em estudo de Leao et al.17 foi de 20,8%, sendo ligeiramente superior no sexo feminino (22,3%), comparativamente ao sexo masculino (20%). As queimaduras por autoextermínio foram muito mais prevalentes entre as mulheres e geralmente acometem grandes porcentagens da superfície corporal. O agente causador das queimaduras mais extensas também foi o álcool, atingindo uma média de 28% de superfície corporal queimada. Dentre as áreas acometidas, destacaram-se o tórax anterior (60,2%), os membros superiores (53,8%) e a cabeça (51%) dos pacientes internados.
Vendrusculo et al.21, em seu estudo, demonstraram que as partes do corpo mais acometidas foram membros superiores, seguindo-se queimaduras oculares e, em terceiro lugar, cabeça e pescoço. A profundidade das lesoes cutâneas esteve presente. As lesoes de primeiro grau isoladas e de primeiro e segundo graus combinadas foram mais frequentes, contribuindo com 102 ocorrências.
Diante dessas situaçoes, há que se investir em programas de prevençao de queimaduras em toda populaçao, e especialmente em crianças, que sao as mais abertas a novas situaçoes, seguindo exemplo de Gosh & Bharat25, os quais demonstraram um programa de prevençao de queimaduras voltado para a educaçao infantil, com excelentes resultados.
CONCLUSAODe acordo com os dados analisados no presente estudo, o sexo masculino é o mais acometido por acidentes com queimaduras, tendo o álcool como a principal fonte de acidentes em todas as faixas etárias, exceto em crianças entre 0 a 4 anos, que sao as mais cometidas por queimaduras, tendo como principal agente etiológico a escaldadura e o principal local de acidente a cozinha doméstica. A média da superfície corporal queimada (SCQ) entre as crianças foi de 10,9%, obtendo o maior índice de queimaduras de segundo e terceiro grau. A regiao corpórea mais afetada por esse tipo de acidente em crianças foi o tronco, seguido dos membros superiores.
A média de idade entre os adultos afetados por queimaduras foi de 25 a 26 anos, tendo como o principal agente etiológico o álcool. A superfície corporal queimada entre os adultos ficou em 14,6%, com elevados índices de queimaduras de primeiro grau isolada e primeiro e segundo grau combinadas. A regiao corpórea mais afetada por acidentes foram as dos membros superiores. A respeito do sexo feminino, ficou evidenciado que o autoextermínio foi o mais acometido por esse gênero, tendo o álcool como principal fonte de recurso.
Como evidenciado neste estudo e comparando estudos nacionais e internacionais, podemos apontar que o domicílio é o local de maior ocorrência de acidentes, resultando em queimaduras de pele. Com isso, fazem-se necessários mais estudos específicos sobre o tema em questao e a aplicaçao efetiva de programas de prevençao a queimaduras que possam atingir os lares e escolas, objetivando a queda de índices de queimaduras nos domicílios e o principal afetado, as crianças.
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1. Acadêmico da Escola Superior da Amazônia (ESAMAZ), Belém, PA, Brasil
2. Professora Mestra especialista da ESAMAZ, Belém, PA, Brasil
Correspondência: Bruno de Freitas Cruz
Passagem Ana Deusa, 75
Belém, PA, Brasil - CEP: 66610-290
E-mail: brunodefreitascruz@hotmail.com
Artigo recebido: 8/10/2012
Artigo aceito: 14/11/2012
Trabalho realizado na Escola Superior da Amazônia - ESAMAZ, Belém, PA, Brasil.