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Artigo Original

Perfil epidemiológico das tentativas de autoextermínio por queimaduras no Distrito Federal

Epidemiological profile of self-extermination attempts by burns in the Federal District

Isadora Bontorin, Ingrid Oliveira Bosenbecker Bauer, Rafael Barbosa de Almeida, Ulysses Rodrigues Castro, Juliana Elvira Herdy Guerra Avila, José Adorno, Simone Maria Sampaio Santos Suassuna, Márcio Rabelo Mota

DOI: 10.5935/2595-170X.20250004

RESUMO

OBJETIVO: Descrever o perfil epidemiológico dos pacientes queimados por tentativa de autoextermínio internados na Unidade de Queimados do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), em Brasília, Distrito Federal, no período compreendido entre janeiro de 2018 e dezembro de 2021.
MÉTODO: Trata-se de um estudo observacional do tipo transversal retrospectivo baseado na análise de 1139 prontuários de pacientes internados na Unidade de Queimados, de janeiro de 2018 a dezembro de 2021. Os dados foram analisados pelo Pacote Estatístico para Ciências Sociais (IBM SPSS, IBM Corporation, Armonk, NY, EUA, 25.0).
RESULTADOS: Foram analisados 1139 prontuários, dos quais, 54 (4,7%) corresponderam a tentativas de autoextermínio, com maior prevalência no sexo feminino (61%) e média de idade de 36 anos. Os agentes mais frequentes foram os líquidos/combustíveis inflamáveis (76%). A superfície corporal queimada foi em média 27%, com tempo médio de hospitalização de 19 dias. O histórico psiquiátrico prévio foi encontrado em 46% dos pacientes, o uso de álcool em 50% e o uso de drogas ilícitas em 34%. Procedimentos cirúrgicos foram realizados em 83% dos pacientes, sendo o desbridamento o mais comum (46%). 18,5% dos pacientes foram a óbito.
CONCLUSÕES: Pacientes queimados por tentativa de autoextermínio foram principalmente mulheres na 4° década de vida. Nestes, os desfechos foram mais graves do que naqueles que sofreram queimaduras acidentais. O histórico de transtorno psiquiátrico foi observado com frequência, o que reforça a necessidade de seguimento ambulatorial especializado para esta população, no intuito de evitar novos episódios de autolesão.

Palavras-chave: Queimaduras. Suicídio. Epidemiologia

ABSTRACT

OBJECTIVE: To describe the epidemiological profile of patients with self-inflicted burns admitted to the Burn Unit of the Regional Hospital of Asa Norte (HRAN) in Brasília, Federal District, between January 2018 and December 2021.
METHODS: This is a retrospective cross-sectional observational study based on the analysis of 1139 medical records of patients admitted to the Burn Unit from January 2018 to December 2021. Data were analyzed using the Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS, IBM Corporation, Armonk, NY, USA, 25.0).
RESULTS: A total of 1139 medical records were analyzed, of which 54 (4.7%) corresponded to self-inflicted burns, with a higher prevalence in females (61%) and a mean age of 36 years. The most frequent agents were liquids/flammable fuels (76%). The average burned body surface area was 27%, with an average hospitalization time of 19 days. A history of psychiatric disorders was found in 46% of patients, alcohol use in 50%, and illicit drug use in 34%. Surgical procedures were performed in 83% of patients, with debridement being the most common (46%). A total of 18.5% of patients died.
CONCLUSION: Patients with self-inflicted burns were mainly women in their 4th decade of life. In these cases, outcomes were more severe than in those with accidental burns. A history of psychiatric disorders was frequently observed, emphasizing the need for specialized outpatient follow-up for this population to prevent further episodes of self-harm.

Keywords: Burns. Suicide. Epidemiology.

INTRODUÇÃO


Traumas por queimadura representam um tipo de lesão orgânica ocasionada por transferência aguda de energia, podendo ser de origem térmica, química, radioativa, elétrica, por congelamento ou fricção1. Dentre os fatores causais, os principais são: chama direta, líquidos aquecidos, contato com superfície aquecida e exposição à fumaça e corrente elétrica2.


Do ponto de vista fisiopatológico, as lesões por queimaduras possuem um caráter dinâmico e expansivo, podendo evoluir de superficial a profunda em um período de 2 a 4 dias, com pico de progressão no 3° dia. Acredita-se que haja um processo de necrose contínua no tecido lesado, contribuindo para a expansão da ferida para sítios anatômicos mais profundos1. Este processo destrói parcial ou totalmente a área corporal atingida, podendo atingir tecido subcutâneo, músculos, tendões e ossos, promovendo deformidades e limitações funcionais nos pacientes2.


Entre as consequências, a sepse é relatada como a causa de óbito mais comum em pacientes internados por queimaduras2. Com o objetivo de evitar infecção e promover a cicatrização do tecido lesado, realiza-se o processo de desbridamento da pele. Este procedimento baseia-se na remoção do tecido necrótico, seguida pelo tratamento da área com agentes antibacterianos. Todas as etapas do processo provocam intensa sensação dolorosa, com bastante dificuldade de se realizar o completo controle álgico3. O controle da dor representa importante avanço no tratamento das queimaduras e ainda consiste em grande desafio.


Dentre as diferentes causas de traumas por queimadura, estão as lesões autoprovocadas e as tentativas de autoextermínio, que representam uma grande questão de saúde pública em todos os países do mundo. O suicídio, segundo Durkheim, é "todo caso de morte que resulta direta ou indiretamente de um ato positivo ou negativo realizado pela própria vítima, a qual ele sabia dever produzir este resultado"4.


Nessa perspectiva, afirma-se que as autolesões provocadas por queimaduras ocorrem por duas distintas razões: práticas de autoflagelamento ou, em casos extremos, tentativa de autoextermínio, configurando uma das formas mais dramáticas de tentativa de suicídio. Diferentes motivações são apontadas como justificativa, tais como: política, rituais religiosos, crenças culturais e questões pessoais e familiares. A motivação para o ato diferencia-se conforme a renda média dos países analisados, tendo os países de renda mais elevada uma associação maior com doenças mentais e/ou abusos de substâncias5.


Nessa conjuntura, reforça-se a estimativa de que os pacientes psiquiátricos têm um risco de 3 a 12 vezes maior de cometer o ato, ou de repeti-lo, em caso de sobrevivência4,6,7. Ainda que haja contato do paciente com os serviços de saúde mental semanas antes da queimadura autoinfligida, há uma falha de identificação, refletindo a perda de oportunidade do controle dos fatores de risco8.


Quando recuperados, os sobreviventes de queimaduras enfrentam não só as consequências biológicas da injúria, como também as consequências psicossociais do trauma. Além disso, frequentemente referem sintomas de estresse pós-traumático, depressão e limitações nas atividades diárias9.


O tempo prolongado de hospitalização, os afastamentos sociais e as aposentadorias por invalidez são fatores que impactam, de forma longínqua, a qualidade de vida do paciente, de seus familiares e, do ponto de vista econômico, o Estado10. Não obstante, as comorbidades psiquiátricas, sobretudo a depressão maior e a psicose, prejudicam de forma mais acentuada a recuperação8. Portanto, a terapia psiquiátrica ativa faz-se fundamental durante o tratamento, desde a internação até o acompanhamento ambulatorial11.


Os estudos que relacionam distúrbios psiquiátricos e queimaduras autoinfligidas são escassos na literatura, apesar do fato ocorrer em distintas regiões mundiais. O escopo desse estudo é, portanto, contribuir com o traçado epidemiológico desses casos, para compreensão do padrão de acometimento e melhoria no seguimento desses pacientes.


OBJETIVO


Descrever o perfil epidemiológico dos pacientes queimados por tentativa de autoextermínio internados na Unidade de Queimados do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), em Brasília, Distrito Federal, no período compreendido entre janeiro de 2018 e dezembro de 2021.


MÉTODO


Trata-se de um estudo descritivo e transversal retrospectivo, com abordagem quantitativa. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde (FEPECS), sob o número 65970622.30000.0023. Foram coletados dados de prontuários do Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), em Brasília-DF, de acordo com a Lei n. 13.787, de 17 de dezembro de 2018.


Foram incluídos no estudo os pacientes vítimas de queimaduras autoprovocadas, maiores de 18 anos, entre os períodos de janeiro de 2018 a dezembro de 2021. Após a análise inicial, foram excluídos os pacientes internados por razões diferentes de tentativa de autoextermínio, aqueles reinternados para correção cirúrgica de sequelas e os pacientes internados para tratamento de outras lesões não relacionadas a queimaduras.


Todas as análises foram realizadas utilizando o Pacote Estatístico para Ciências Sociais (IBM SPSS, IBM Corporation, Armonk, NY, EUA, 25.0). A análise descritiva foi utilizada para cálculos de medidas descritivas (média, desvio padrão, valores mínimos e máximos), frequência absoluta e relativa. Teste de Shapiro-Wilk foi utilizado para verificar a distribuição de normalidade dos dados.


Para comparação das variáveis de acordo com o grupo de desfecho clínico, utilizou-se teste t para variável com distribuição normal e teste U de Mann-Whitney quando não verificada a normalidade. A comparação das variáveis categóricas foi realizada por meio do teste exato de Fischer (contagem < 5). Posteriormente, uma análise de regressão logística univariada foi empregada para verificar os fatores de risco relacionados ao desfecho clínico. O odds ratio (OR) e o intervalo de confiança de 95% (IC) foram calculados. Adotou-se (p<0,05) como significância.


RESULTADOS


Foram analisados 1139 prontuários de pacientes internados por queimaduras e, dentre estes, 54 corresponderam a tentativas de autoextermínio, representando 4,7% do total dos prontuários. Dos quatro anos revistos, 2020 concentrou a maior prevalência, correspondendo a 27,8% das ocorrências de toda a casuística. Os dados de distribuição anual estão presentes na Tabela 1.


 



 


Os pacientes apresentaram idade média de 36,7 (± 10,9 anos), tempo de hospitalização de 19,8 (± 17,7 dias) e percentual de superfície corporal queimada de 27,4 (± 27,9%) variando entre 2% e 100%. 18,5% dos pacientes internados por tentativa de autoextermínio foram a óbito (Tabela 2).


 



 


Dentre os pacientes com queimaduras autoprovocadas, a maior parte foi do sexo feminino (61,1%), o agente predominante foi líquido inflamável (75,9%) seguido por chama direta/líquido aquecido (22,2%). 53,7% não apresentaram história psiquiátrica prévia, 50% tinham histórico de etilismo e 66% de drogadição. Infecções secundárias foram observadas em 61,1%. O uso de antibióticos ocorreu em 79,5% e as intervenções cirúrgicas (desbridamento e enxerto) em 83,3%.


O uso de antibióticos profiláticos é realizado em todos os pacientes submetidos a intervenção cirúrgica que não estão utilizando previamente para tratar quadros infecciosos. A isto atribui-se o achado de um percentual menor de infecções secundárias quando comparado ao percentual de pacientes que utilizaram antibióticos.


Para verificação das variáveis de associação com desfecho principal, observou-se apenas o etilismo como variável associada ao menor risco de óbito (p=0,019; OR=0,077; IC95%=0,009 - 0,661), conforme apresentado na Tabela 3.


 



 


Dentre os procedimentos cirúrgicos realizados, o mais frequente foi o desbridamento, realizado em 74,1% dos pacientes, seguido por enxerto, realizado em 68,5% dos pacientes, conforme a Tabela 4.


 



 


DISCUSSÃO


Queimaduras são consideradas um problema de saúde pública, não só devido a sua alta incidência, como também devido ao impacto na morbimortalidade. Diferentes causas estão envolvidas, sendo a tentativa de autoextermínio uma razão menos frequente, mas com relevante gravidade. Neste estudo, foram observados 54 casos, os quais representaram 4,7% das internações entre os anos de 2018 e 2021. Este resultado assemelha-se a outras pesquisas acerca do tema. Uma pesquisa realizada em Palmas (BR) por Simaan et al.12, analisou 431 pacientes, sendo as tentativas de autoextermínio 2,78% do total. Em Londrina (BR), um estudo com 178 pacientes, conduzido por Mireski et al.13, relatou um valor aproximado de 10%, dado semelhante ao encontrado no Uruguai, onde Lena et al.14 pesquisaram 2.273 pacientes ao longo de 20 anos (1995-2015).


No ano de 2020, ocorreu a maior parte dos incidentes referentes a tentativas de autoextermínio (27,8%), assim como o maior número de internações por queimaduras em geral (26,5%), devendo-se destacar o contexto da pandemia. Nesse período, mudanças significativas nos ambientes e hábitos domésticos colocaram as famílias em maior risco de queimaduras, assim como trouxeram prejuízos significativos do ponto de vista social e psicológico. O ato de cozinhar com mais frequência em casa, o uso inadequado de desinfetantes à base de álcool, assim como o trabalho em domicílio em conjunto com a necessidade de supervisão dos filhos representam fatores que colaboraram para a ocorrência de queimaduras acidentais15.


O álcool líquido, por ser um produto culturalmente muito utilizado como agente de limpeza doméstica, é um dos principais responsáveis por esse tipo de acidente. Seu uso está associado a queimaduras com maior porcentagem da superfície corporal queimada, ao maior número de óbitos, assim como à elevada quantidade de admissões na unidade de terapia intensiva quando comparado às queimaduras por outros agentes.


O contexto de pandemia, com as recomendações de antissepsia com o uso de álcool em altas concentrações tanto para a higiene das mãos como para a limpeza de superfícies, contribuiu para o aumento da incidência de queimaduras em pessoas que não estavam apenas envolvidas em atividades domésticas, mas também em trabalhadores que perderam o emprego e em crianças e estudantes que pararam de frequentar a escola16.


Outro ponto importante acerca desse período é a ocorrência de tentativas de suicídio com o uso desse agente. Estudo multicêntrico sobre o aumento do uso do álcool nas práticas domésticas destaca que o maior número dessas tentativas pode ter como possível explicação a instalação de um ambiente de estresse e incertezas, o isolamento social e os problemas econômicos causados pela COVID-19, representando um significativo impacto na saúde mental dos indivíduos16.


Além disso, esse período de confinamento resultou em uma resposta sociocomportamental complexa na população, incluindo mudanças nos padrões de consumo de bebida alcoólica. Sua ingestão por aqueles que possuíam transtornos anteriores de etilismo aumentou durante a pandemia, incluindo aqueles anteriormente abstinentes. A associação entre consumo de álcool e a ocorrência de queimaduras foi evidente em estudo realizado na Unidade de Queimaduras do Hospital Distrital de Salisbury, na Inglaterra17.


O sexo feminino foi majoritário em incidência de casos (61,1%), em nosso estudo e nos demais realizados no Brasil4,6,13,14. Em contrapartida, pesquisas realizadas na América do Norte apontam uma preponderância do sexo masculino, com aproximadamente 60% dos casos5,7,8,11. Contudo, Dobson et al.8 apontam que o sexo feminino possui uma história psiquiátrica melhor estabelecida e também maior contato com a rede de saúde mental.


Em relação à média de idade, não foram observadas grandes disparidades entre os achados, seja nos trabalhos que pesquisam autoextermínio, seja nos demais, com média variando entre 32 e 41 anos10,13,18,19, dado que coincide com a presente pesquisa, em que foi observada uma média de idade de 36,7 anos.


Como agente principal das queimaduras, encontramos os líquidos inflamáveis, presentes em 75,9% dos casos. Este valor é consonante aos demais relatados na literatura brasileira, que citaram o álcool como agente catalisador presente entre 46% e 84% das queimaduras4,13,20. Esses dados, no entanto, destoam dos encontrados por Yabanoglu et al.18, que avaliaram 4.776 pacientes por queimaduras em 3 diferentes centros de tratamento na Turquia, sendo 20 desses por tentativa de autoextermínio. Os autores encontraram o uso de agente condutor em 11 dos casos estudados, sendo a gasolina o agente mais comum, seguida pelo tíner de pintura. O álcool não chega a ser citado no estudo. Tal disparidade reitera a necessidade de controle do acesso ao álcool líquido na população brasileira, visto que o mesmo impera como principal catalisador de queimaduras em diferentes estudos18.


A extensão de superfície corporal queimada foi em média de 27,4%, indo ao encontro à média relatada na literatura, que variou de 15% a 53%6,10,18,21. O tempo médio de hospitalização observado foi de 19 dias, um pouco menor do que nos principais trabalhos encontrados6,13,20.


A progressão para óbito é bastante variável na literatura quando comparadas as queimaduras acidentais e as autoinfligidas, sendo que as últimas possuem um valor de mortalidade maior quando comparadas às primeiras2,6,10,18,22. Em nossa casuística, encontramos uma taxa de mortalidade de 18,5%.


Dos pacientes com lesões autoinfligidas, 83,3% necessitaram de tratamento cirúrgico, sendo o desbridamento o procedimento mais realizado, em 46,5% dos casos. No que tange às complicações, o desenvolvimento de infecção foi a predominante (61,1%). As infecções secundárias representaram uma das principais complicações também em outros estudos, sendo a sepse apontada como a causa de óbito mais frequente, com o relato de dados na literatura variando de 53 a 85% dos casos de queimaduras em geral2,19.


A tentativa de autoextermínio por queimadura autoinfligida é considerada um método relevante de suicídio. Nessa perspectiva, citam-se os transtornos psiquiátricos como fatores de risco frequentemente associados. Em nossa pesquisa, encontramos um histórico de doença psiquiátrica em 46,3% dos pacientes, o que dista parcialmente da literatura, na qual varia de 32% a 87%5,6,12,13,20. A pesquisa conduzida por Restrepo et al.23 aponta que o transtorno bipolar e as alucinações auditivas são as psicoses mais frequentemente encontradas nesses casos. Outros fatores de risco associados são o etilismo e a drogadição, encontrados por nós em 50% e 34% dos casos, respectivamente.


Smith et al.5 conduziram uma pesquisa no centro de referência de queimaduras da Califórnia e encontraram o valor mais alto de associação entre os distúrbios mentais e a tentativa de autoextermínio por queimadura (87,4%), revelando haver nesse público lesões mais extensas, com maior chance de mortalidade do que as queimaduras acidentais. Atwell et al.7 reforçam que pacientes com queimaduras autoinfligidas têm risco elevado em 11 vezes para possuir tratamento psiquiátrico prévio, em 4 vezes para abuso de álcool e maior propensão para repetir o feito. Nessa perspectiva, Dobson et al.8 afirmam que grande parte dos pacientes por eles analisados tiveram contato com o serviço de saúde mental um mês antes do feito, sendo que, desses, 50% referiram a intenção de autolesão. Os autores reforçam a necessidade de testes de triagem assertivos para a identificação de risco iminente de suicídio por queimadura.


CONCLUSÕES


Os resultados dessa pesquisa trazem um alerta em relação à necessidade de desenvolvimento de políticas públicas voltadas à população mais vulnerável à tentativa de suicídio. Mulheres jovens com transtornos psiquiátricos e/ou histórico de etilismo ou drogadição devem receber atenção especial voltada à prevenção de autoextermínio.


Além disso, considerando que o álcool é um agente amplamente empregado nas práticas de limpeza doméstica e que passou a ser usado com mais frequência em uma concentração mais elevada no contexto da pandemia, é relevante a adoção de campanhas de conscientização sobre a forma mais segura para utilizá-lo. Deve-se também implementar políticas públicas que tenham como objetivo a regulação e o controle mais rigorosos sobre a fabricação, a venda e a distribuição de álcool etílico em graduações mais elevada, com a resolução sobre a adoção de regulamento técnico para o álcool etílico hidratado, em todas as graduações, comercializado por atacadistas e varejistas.


Ademais, nas vítimas de queimaduras autoinfligidas, há que se atentar para a prevenção e controle efetivo de quadros infecciosos, a fim de melhorar a recuperação e prevenir complicações mais graves como a sepse e desfechos para óbito.


O diagnóstico psiquiátrico prévio é comum, o que demonstra a necessidade de padronização do tratamento médico e psicológico para todos os pacientes durante a internação e também após a alta hospitalar, com o seguimento ambulatorial, com o fito de prover tratamento nas esferas biológica, psicológica e social.


AGRADECIMENTOS


Agradecemos ao Doutor Mário Frattini Gonçalves Ramos pelo auxílio e orientações durante a coleta dos dados e por suas valorosas contribuições ao longo do processo de escrita deste trabalho.


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Recebido em 8 de Fevereiro de 2024.
Aceito em 5 de Maio de 2025.

Local de realização do trabalho: Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), Brasília, DF, Brasil.

Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.


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