O cuidado com o ser humano e com todo o tratamento de queimaduras atravessa séculos, sendo um dos mais antigos desafios da medicina. Desde Hipócrates, considerado o "pai da Medicina", há registros sobre o tratamento de lesões térmicas. No século V a.C., ele já descrevia métodos rudimentares de manejo, como o uso de gordura animal e emplastros, compreendendo a necessidade de aliviar a dor e proteger os tecidos lesionados, preservando o cuidado humano. Esses primeiros passos representam a base sobre a qual, ao longo da história, a medicina foi aperfeiçoando técnicas e expandindo conhecimentos no tratamento das queimaduras^1,2.

Hoje, no Brasil, o cuidado com pacientes queimados assume uma importância ainda maior, dada a elevada incidência e as particularidades socioeconômicas e culturais do nosso país. Estima-se que mais de um milhão de casos de queimaduras ocorram anualmente em território nacional (acreditamos que este número seja ainda maior devido à subnotificação), sendo a maioria deles evitáveis. Homens em idade laborativa ativa, crianças, mulheres e trabalhadores informais são frequentemente as principais vítimas, revelando um grave problema de saúde pública social e econômica, associado muitas vezes à desigualdade social, à falta de informação e à ausência de políticas de prevenção mais efetivas³.

As queimaduras não são apenas lesões físicas; representam traumas emocionais e sociais profundos, que exigem abordagem multidisciplinar, desde o atendimento emergencial até a reabilitação completa e a reintegração à vida comunitária. Nesse contexto, o trabalho das unidades especializadas em queimaduras no Brasil, bem como o esforço de profissionais comprometidos com a atualização científica e a humanização do cuidado, tornam-se pilares indispensáveis^4,5.

A Revista Brasileira de Queimaduras reafirma, neste editorial, seu compromisso em ser um espaço de divulgação, reflexão e estímulo ao desenvolvimento de boas práticas, pesquisas e políticas públicas voltadas para a prevenção e o tratamento das queimaduras em nosso país. Mais do que uma publicação científica, buscamos ser uma ferramenta de transformação social e de valorização do cuidado integral ao paciente queimado.

Inspirados pela história milenar da medicina e conscientes dos desafios atuais, seguimos confiantes na capacidade da ciência brasileira e dos profissionais de saúde em construir um futuro no qual o sofrimento causado pelas queimaduras seja, cada vez mais, evitado e adequadamente tratado. Nossos cumprimentos a todos leitores que diariamente lutam pelo paciente queimado no Brasil.

REFERÊNCIAS

1. Greenfield LJ. Surgery: Scientific Principles and Practice. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2005.

2. Artz CP, Moncrief JA. The Treatment of Burns. Philadelphia: W. B. Saunders; 1969.

3. Sociedade Brasileira de Queimaduras. Queimaduras levam cerca de 70 mil pessoas ao hospital anualmente no Brasil [Acesso 16 Jun 2025]. Disponível em: https://sbqueimaduras.org.br/noticia/queimaduras-levam-cerca-de-70-mil-pessoas-ao-hospital-anualmente-no-brasil?utm_

4. Brasil. Ministério da Saúde. Cartilha de Prevenção de Queimaduras. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [Acesso 16 Jun 2025]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br

5. Lopez LB, Andrade D. História dos cuidados com as queimaduras: do empirismo à ciência. Rev Bras Queimaduras. 2004;3(1):18-22.