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Tentativa de autoextermínio com queimaduras - CTQ-HFA-RJ

Attempted self-annihilation with burns - CTQ-HFA-RJ

Iole Dielle de Carvalho1; Maria Cristina do Valle Freitas2; Luiz Macieira3

RESUMO

OBJETIVO: Analisar os casos de tentativa de autoextermínio com queimadura, admitidos entre janeiro de 2008 e dezembro de 2013 no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí, no Rio de Janeiro, RJ.
MÉTODOS: Foram tomados por base dados colhidos nos atendimentos e análise de prontuários do referido setor.
RESULTADOS: Foram internados 40 pacientes vítimas de queimadura por tentativa de autoextermínio, sendo 85% do sexo feminino; idade entre 15 a 68 anos (média 35,5%); 72,5% causados por combustao de álcool; área queimada de 8% a 85% (média de 34,7%) e 20% de óbito.
CONCLUSAO: A queimadura por autoextermínio predomina no paciente feminino, adulto jovem, com alta mortalidade.

Palavras-chave: Queimaduras. Tentativa de Suicídio. Suicídio.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To analyze cases of attempted self-extermination with burns admitted between January 2008 and December 2013 in Burn Unit Center of the Federal Hospital Andaraí, in Rio de Janeiro, RJ.
METHODS: They were taken based on data collected, and analysis of records of that sector.
RESULTS: Forty burn victims of attempted self-extermination patients were admitted; 85% were female; aged 15-68 years (mean 35.5%); 72.5% caused by combustion of alcohol; burned area from 8% to 85% (average 34.7%) and 20% death rate.
CONCLUSION: Burning for self-extermination predominates in the female patient, young adult, with high mortality.

Keywords: Burns. Suicide, Attempted. Suicide.

INTRODUÇAO

Suicídio é definido como o ato onisciente de aniquilaçao autoinduzida, melhor entendido como enfermidade multidimensional em um indivíduo carente que define uma questao, para a qual o ato é a melhor soluçao1.

Entre os países com mais alto índice de suicídios estao Lituânia 34,1, Coreia do Sul 31,2, Guiana 26,4, Cazaquistao 25,6, Belarus 25,3, Hungria 24,6, Japao 23,8, Letônia 22,9, China 22,2 e Eslovênia 21,9 (a taxa ao lado do nome do país corresponde ao número de pessoas que cometem suicídio em um ano para cada 100.000 pessoas)2.

A Organizaçao Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu o dia 10 de setembro como o Dia Mundial da Prevençao do Suicídio. O objetivo é sensibilizar a populaçao para a importância do tema. Os números da OMS sao impressionantes:

- a cada ano, aproximadamente 1 milhao de pessoas morrem em todo mundo por suicídios;

- crescimento de 60% nos últimos 45 anos;

- para cada caso consumado de suicídio, há 20 tentativas;

- embora tradicionalmente o número de suicídios seja maior entre idosos, verifica-se o aumento da incidência de óbitos por esta causa entre os mais jovens.

A informaçao mais surpreendente, entretanto, é que o suicídio é prevenível em 90% dos casos.

Segundo a OMS, no Brasil a taxa de suicídio corresponde a 5,8 em cada 100.000 habitantes, ocupando o 113º lugar na média mundial em 2012, com crescimento de 10,4% entre 2000-2012. "Os suicídios no país vêm aumentando de forma progressiva e constante: a década de 80 praticamente nao teve crescimento (2,7%); na década de 90, o crescimento foi de 18,8% e daí até 2011 de 28,3%", diz o coordenador do Mapa da Violência, professor Julio Jacobo Waiselfisz.

No Brasil, estima-se que 25 pessoas cometam suicídio por dia. Segundo a OMS, a tendência é de crescimento dessas mortes entre os jovens, especialmente nos países em desenvolvimento. Nos últimos 20 anos, o suicídio cresceu 30% entre os brasileiros com idades de 15 a 29 anos, tornando-se a terceira principal causa de morte de pessoas em plena vida produtiva no País (acidentes e homicídios precedem). No mundo, cerca de 1 milhao de pessoas morrem anualmente por essa causa. A OMS estima que haverá 1,5 milhao de vidas perdidas por suicídio em 2020, representando 2,4% de todas as mortes.

Diferentes fatores influenciam a incidência de suicídio. Entre eles, temos: a época do ano, sexo, idade, condiçao social, saúde física e mental3.

Suicídio por queimadura em autoextermínio é muito raro no mundo ocidental, mas é mais frequente no Oriente, especialmente na India, onde está ligado a tradiçoes religiosas4,5.

O objetivo deste estudo é analisar este especifico grupo de pacientes no período de janeiro de 2008 a dezembro de 2013, admitidos no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí (CTQ-HFA), no Rio de Janeiro, RJ.


MÉTODOS

Neste estudo prospectivo,sao analisados 40 casos de tentativa de autoextermínio com queimadura, admitidos no período de janeiro de 2008 a dezembro 2013 no CTQ-HFA. Informaçoes sobre idade, gênero, agente causal, tempo de internaçao, área de superfície corporal queimada e óbitos foram coletadas da base de dados e prontuários do CTQ-HFA.


RESULTADOS

No período analisado de janeiro de 2008 a dezembro de 2013, foram internados no CTQ-HFA 40 pacientes vítimas de queimadura por tentativa de autoextermínio, sendo 85% do sexo feminino; idade entre 15 a 68 anos (média 35,5%); 72,5%causados por combustao de álcool; área queimada de 8% a 85% (média de 34,7%) e 20% de óbito (Figuras 1 a 7).


Figura 1 - Perfil epidemiológico dos pacientes internados por tentativa de autoextermínio em 2008 no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí.


Figura 2 - Perfil epidemiológico dos pacientes internados por tentativa de autoextermínio em 2009 no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí.


Figura 3 - Perfil epidemiológico dos pacientes internados por tentativa de autoextermínio em 2010 no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí.


Figura 4 - Perfil epidemiológico dos pacientes internados por tentativa de autoextermínio em 2011 no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí.


Figura 5 - Perfil epidemiológico dos pacientes internados por tentativa de autoextermínio em 2012 no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí.


Figura 6 - Perfil epidemiológico dos pacientes internados por tentativa de autoextermínio em 2013 no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí.


Figura 7 - Média de idade, prevalência de gênero, agente causal, tempo de internaçao, área de superfície corporal queimada e porcentagem de óbitos dos 40 pacientes internados por tentativa de autoextermínio no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí entre janeiro 2008 e dezembro de 2013.



DISCUSSAO

O risco de suicídio entre pacientes psiquiátricos é três a 12 vezes maior do que o risco dos pacientes nao psiquiátricos6-8. De acordo com a literatura, quase 95% dos pacientes que cometem o suicídio têm uma doença mental diagnosticada e tratável8. Os transtornos decisivos, principalmente o transtorno do humor, respondem por 80% deste número, com a esquizofrenia sendo responsável por 10%, e a demência, por 5%9. No estudo em questao, nao foi verificado paciente com quadro de demência. É importante ressaltar que, entre todas as pessoas com transtornos mentais, 25% também sao dependentes do álcool ou drogas e têm duplos diagnósticos10.

Um maior número de tentativas de autoextermínio é encontrado no sexo feminino, na faixa etária entre 15 a 60 anos, pelo qual tem sido sugerida a ligaçao com alteraçoes emocionais de tipo depressiva, características da menopausa, e que abrangeria uma parte das mulheres neste grupo3. No nosso estudo, a média de idade foi de 32 anos, nao estando de acordo com este dado da literatura.

Ainda nao sao claras as razoes para a escolha da queimadura como método de suicídio. Quando perguntamos por que a queimadura como método de escolha para o autoextermínio, observamos que a maioria respondeu que "pensava que morreria rapidamente", tendo uma das pacientes dito que, "nao pensava que ia sentir dor; pensava que o fogo a consumiria rápido."11.

Evidências têm se acumulado de que fatores genéticos possam ser incluídos entre os muitos determinantes do suicídio. Estudos clínicos psiquiátricos sugerem que o risco de comportamento suicida aumenta na presença de uma história familiar de suicídio e, ainda, estudos com gêmeos monozigotos mostram uma elevada concordância. Além disso, a genética molecular tem registrado polimorfismo no gene da enzima triptofano-hidroxilase, causando diminuiçao da síntese e secreçao da serotonina, e provocando maior tendência ao suicídio12,13.

Na nossa casuística, os homens tiveram um suicídio bem sucedido, com 33% de óbitos, em comparaçao com 14,4% das mulheres. É importante ressaltar que quanto maior tiver sido o risco potencial de morte na tentativa inicial, maior é a chance de repetir a tentativa e com uma taxa maior de sucesso. Razao pela qual mais determinado deve ser o esforço para fornecer tratamento e suporte psicológico após a alta hospitalar do paciente. Quanto maior a área de superfície corporal queimada, maior a chance de óbito, chegando a 83% de mortalidade quando a área foi entre 60% e 85%. A maioria destes pacientes atendida no pronto-socorro nao relata, em um primeiro momento, ter sido vítima de autoextermínio; porém, o fazem durante o acompanhamento psicológico e também quando se sentem mais à vontade com a equipe.


CONCLUSAO

A partir dos dados analisados neste estudo, podemos concluir que: temos uma frequência importante da queimadura (que continua sendo uma doença negligenciada - questao de saúde pública) e a porcentagem de óbitos que ela ocasiona. A queimadura por autoextermínio predomina no paciente feminino, adulto jovem, com alta mortalidade.

Chamamos a atençao à facilidade de acesso ao álcool, agente mais comum das queimaduras em geral; portanto, é importante enfatizarmos a necessidade de campanhas publicitárias para diminuir a utilizaçao deste produto como agente etiológico do autoextermínio por queimadura e de queimaduras em geral.


REFERENCIAS

1. Kaplan HI, Sadock BJ, Grebb JA. Compêndio de Psiquiatria - Ciências do Comportamento e Psiquiatria Clínica. 7ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 1997.

2. Conexao Corbélia [Acesso 18 ago 2014]. Disponível em: http://conexaocorbelia.com.br/category/news-corbelia/

3. Cave Bondi G, Cipolloni L, Parroni E, Cecchi R. A review of suicides by burning in Rome between 1947-1997 examined by the Pathology Department of the Institute of Forensic Medicine, University of Rome 'La Sapienza'. Burns. 2001;27(3):227-31.

4. Sheth H, Dziewulski P, Settle JA. Self-inflicted burns: a common way of suicide in the Asian population. A 10-year retrospective study. Burns. 1994;20(4):334-5.

5. Gehlot PS, Nathawat SS. Suicide and family constellation in India. Am J Psychother. 1983;37(2):273-8.

6. Mzezewa S, Jonsson K, Aberg M, Salemark L. A Prospective study on the epidemiology of burns in patients admitted to the Harare burn units. Burns. 1999;25(6):499-504.

7. Roy A, Nielsen D, Rylander G, Sarchiapone M, Segal N. Genetics of suicide in depression. J Clin Psychiatry. 1999;60 Suppl 2:12-7.

8. Jamison KR, Baldessarini RJ. Effects of medical interventions on suicidal behavior. Introduction. J Clin Psychiatry. 1999;60 Suppl 2:4-6.

9. Simpson SG, Jamison KR. The risk of suicide in patients with bipolar disorders. J Clin Psychiatry. 1999;60 Suppl 2:53-6

10. Crosby K, Rhee JO, Holland J. Suicide by fire: a contemporary method of political protest. Int J Soc Psychiatry. 1977;23(1):60-9.

11. Carvalho ID, Serra MCVF, Macieira Jr L. Queimadura: tentativa de autoextermínio. Análise de uma década no Hospital do Andaraí - RJ: 2000-2010. Rev Bras Queimaduras. 2011;10(2):57-60.

12. Alves CB, Serra MC, Gomes RD, Macieira L, Pitanguy I. Suicídio por fogo: experiência de 57 casos. Rev. Bras Queimaduras. 2001;1(1):5-8.

13. Leth P, Hart-Madsen M. Suicide by self-incineration. Am J Forensic Med Pathol. 1997;18(2):113-8.










1. Psicóloga do Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
2. Médica da rotina do Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
3. Chefe do Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Federal do Andaraí, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Correspondência:
Maria Cristina do Valle Freitas Serra
Hospital Federal do Andaraí, Centro de Tratamento de Queimados
Rua Leopoldo, 280 - Andaraí
Rio de Janeiro, RJ, Brasil - CEP 20541-170
E-mail: mcriss@superig.com.br

Artigo recebido: 20/8/2014
Artigo aceito: 22/9/2014

Trabalho realizado no Hospital Federal do Andaraí, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

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